Sob o império da mediocridade, observa-se, na atualidade do pensamento nacional, a evidência de elemento perniciosos e deletérios que, trocando figurinhas entre si, consagram a intolerância e a crueldade para com tantos quanto aspirem as novas formas, quer nas artes, quer na política, ou, ainda, naquela que é considerada uma superestrutura do Estado - o Direito.
Afastados da prevalência da realidade ou da observação sobre a fantasia, registra-se a tendência para fazer consistir o pensamento mais nos vôos arrojados da imaginação do que no estudo minucioso da realidade.
Já Almeida Garrett, em Portugal do século XIX, asseverava: “... O tom e o espírito verdadeiro português, esse é preciso e forçoso estudá-lo no grande livro nacional, que é o povo e as suas tradições, as suas virtudes e os seus vícios, e as suas crenças e os seus erros”.
Obviamente, a reação do grande escritor lusitano aos motivos literários clássicos, já então demasiadamente sovados, encontraria eco entre intelectuais de militância várias. Entendendo a literatura como mais um reflexo de cada momento histórico, não nos será difícil ou arriscado concordar com a exigência de critérios mais abertos, quando se pretende acurada análise de um povo num exato momento de sua particular história.
Ou, como doutrinava Victor Hugo: “... Não há regras nem modelos além das leis gerais da natureza... além das leis especiais que, para cada composição, derivam das condições próprias a cada assunto”.
Nem o rigor dos “românticos”, a propugnar volta aos modelos mais genuinamente nacionais, nem o hiper-realismo de sonhadores e suas utopias. Mas, muito menos o elogio-mútuo dos que insistem em forjar valores limitados e, por isso mesmo, torpes. Quem sabe o regionalismo, o psicologismo e o neo-realismo possam resgatar a essência do pensamento nacional, e com ela traçar mais verdadeiramente o perfil do homem brasileiro.
Intolerável, isso sim, é o pedantismo de seletos grupos que se auto-declaram mentores de uma nova era, de um porvir seguro e promissor. Detentores de retórica singular, aprisionam a nação como mero objeto de tolas elocubrações. Apoiados pela cumplicidade de uma enferma e inexorável multi-mídia (apêndice, aliás, da intelectualidade arrogante!), protejam-se uns aos outros, no restrito “club” dos bem dotados.
Não raro o irrealismo desses apóstolos da nova ordem surge com messiânica redenção à fome nacional, de miseráveis hordas exortadas à prática de teorias em tudo alienígenas ao próprio meio e às tradições peculiares.
Não raro o oportunismo do elogio-mútuo consagra normas irreais como legítimas, calcando na subserviência a respeitabilidade da falsa liderança.
Como em terra de cego quem tem um olho é caolho, poucos conservam, ainda, ingenuidade e autenticidade para exclamar: “o rei está nu!”. Ao contrário, via de regra a má índole é acobertada por láureas, num duvidoso mérito de academicismo.
Preferível então, o “Elogio da Loucura”, de Erasmo de Roterdam, mordaz, ao descaramento, à imprudência dos cínicos modernos.
Pior de que determinadas loucuras não são mais que o absurdo e caótico se revelando em interstício de lucidez. Cultuar essa normalidade esquálida, em incontroversa aceitação, é admitir anônima neurose como cânone inalienável, é eleger o elogio-mútuo corifeu de nossas individualidades.
Precisamos tanto de um discurso sofista quanto de quinze minutos de fama. Esta última, como bem expressou o “gênio” da pop-art, Warhol, de há muito já conquistamos.
Agora que o futuro já chegou, possibilitando a simultaneidade de fatos, opiniões e interpretações, não há mais vez para a sujeição ao minimalismo elitista. Aproveitar do que há de melhor em todos os sistemas políticos, jurídicos e artísticos, será encontrar no ecletismo reformulação básica da democracia, aqui entendida como a protagonização ampla e individual, muito acima de insistentes coadjuvantes da nova Escola do Elogio-mútuo.
(Marcus Moreira Machado)
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