REMETENTE e DESTINATÁRIO alternam-se em TESES e ANTÍTESES. O ANTAGONISMO das CONTRADITAS alçando vôo à INTANGÍVEL verdade.
sábado, 22 de agosto de 2009
QUINTA-FEIRA, 27 DE AGOSTO DE 2009:"ESPECTADORES"
Não se pode e nem se deve crer que as pessoas não mudem, jamais, de opinião, e assim com o passar dos anos, passem a observar sob prismas antes ignorados ou desprezados o que até então julgavam por pronto e acabado, insuscetível de reavaliação. Afinal, aos oitenta para uns, aos trinta para outros, a vida fica mais velha e mais sábia, revelando-se mesmo surpreendente no que pode oferecer, e menos exigente do que se supunha. Irredutível nem será bom sinônimo convicto, pois superveniência é, de fato, a ocorrência plausível para o comum mortal. Não sem motivo, no decorrer dos anos, é surpreendente o caminho que se nos apresenta um dado instante para, em seguida, quase atônitos, nos depararmos com súbita nova rota do anterior percurso.
E tudo que se nos afigurava como certeza é substituído, fazendo ruir idéias e ideologias aparentemente sedimentadas em indestrutível amálgama, forjando-se, a partir daí, conseqüente sucessão de possibilidades, como num alerta ao destino indefectível.
Uma pequena dose de bom senso obriga uma resposta imediata à fragilidade inerente a cada um de nós seres humanos; nenhum questionamento, por sério e oportuno, compreenderá conclusões inevitáveis. Dessa forma, não há exatamente alternância de opiniões, porém, acréscimos, pré-conceitos circunstanciados e efêmeros. Pois, definitivamente, a regra é a indefinição e a sabedoria é a exceção.
Acreditar-se pleno, crer-se íntegro, quando se desconhece os desígnios próprios à nossa natureza limitada, é superestimar uma capacidade subordinada a intervenções do imponderável. Da nossa essência sabemos muito pouco, conhecimento esse que nos reduz a meros espectadores, ainda que a nossa pretensão seja alcançar do infinito as suas fronteiras. Ora, semelhança não será, jamais, igualdade; e o muito conquistado pelo homem em toda a história de sua civilização não foi mais que a simples manipulação de conhecimentos básicos. Criaturas, eis o que somos; criadores, o que ingenuamente pretendemos ser. (Marcus Moreira Machado)
QUARTA-FEIRA, 26 DE AGOSTO DE 2009:"CAÇADOR DA VERDADE"
Tanto Sócrates quanto Platão entendiam que pouco progresso advém da comunicação direta do conhecimento. Para os 2 filósofos, importante é a capacidade de pensar, criando mentes capazes de formar conclusões corretas, de encontrar a verdade por si mesmas. Na definição de Platão, o homem é o “caçador da verdade”, sendo, sim, valiosa a busca e não a posse do saber. Também pensadores modernos enaltecem a verdade desse mesmo princípio, como se observa na ponderação de Jean Paul Richter: “Não é o fim, mas o movimento que nos faz feliz.” A ruptura dessa apologia é consequência do exagerado realismo verificado na educação com o progresso científico. De fato, o utilitarismo do conhecimento atual tem menosprezado a importância do autodesenvolvimento como princípio fundamental no processo de aprendizagem. E, sem dúvida, nesse sentido, o papel da escola é cultivar virtudes intelectuais. Pois, o que é “disciplina, senão a antítese de “doutrina”? O professor, assim, é detentor, de um corpo sistematizado de conhecimento, enquanto os alunos apropriam-se da parte dessa doutrina que mais condiz com as suas necessidades individuais.
É nesses contexto que, mesmo sendo a escola um reflexo do meio social de onde se originou, pode a sociedade ser reformada a partir da instituição educacional. Mas, é sempre a educação democrática que viabiliza essa reforma, através do reconhecimento de habilidades, resultantes da prática inteligente e continuada, e pelo estímulo do conhecimento e da compreensão, pela observação e pensamento reflexivo. (Marcus Moreira Machado)
sexta-feira, 21 de agosto de 2009
TERÇA-FEIRA, 25 DE AGOSTO DE 2009:"CALENDAS"
Nada de novo acontece. Está tudo fora do lugar como sempre esteve. Todo mundo prometendo e ninguém cumprindo. Um plano após o outro, a inflação nossa de cada dia desafiando economistas ortodoxos e heterodoxos, reforma ministerial, sucessão presidencial... Já ouvi isso antes. Quando foi? Em 1993?
O futuro faz tempo já chegou, ele já não causa espécie. No Brasil estamos de volta ao passado; num breve instante tudo aconteceu: a Independência, a República - a Velha, a Nova duas vezes -, Getúlio, os militares antes e durante, os militares depois, .os civis agora como outrora, Salvador, Rio de Janeiro, Brasília, cana-de açúcar, café e cimento. Calendário, agendas permanentes serão um bom presente? Será bom, compromisso marcado em país tão incerto?
Cá no Brasil o tempo varia. E tanto que ampulheta jamais seria de exato formato entre nós; provavelmente ela teria alterada uma de suas bocas, cabendo muito mais areia na parte de cima; “estrangulando o tempo”, impedindo-o de “se colocar” na parte inferior. Aqui a pontualidade inglesa só existe na saída, nunca na chegada. E mesmo porque nós brasileiros somos todos atletas, todos correndo contra o tempo, batendo e superando recordes, num espetacular despreparo físico na maratona contra a penúria a que os mais sofisticados invariavelmente chamam “recessão”; possivelmente São Gregório desconhecia Pindorama. Assim, em se tratando de datas, para nós o que de fato sobrevivem são as calendas gregas, quer dizer, “no dia de São Nunca”.
E o que falar de “khronos”? Certamente não temos um tratado das divisões do tempo a enumerar sucessivamente os fatos históricos. História existe a de outros povos, não a nossa. Somos mouros porque somos ibero-americanos, romanos decisivamente há muito que somos, cristianizados ou não; ainda somos atenienses, espartanos e cretenses pela saga latina no “helenismo”. Pois somos quase tudo e quase nada. Pois somos senhores e vassalos na Cisplatina “inglesa” ou na industrial revolução galesa. Mas, por sermos tanta coisa ao mesmo tempo, justamente é o tempo que não temos, porque, escravos, dele, não o discernimos como lógica sucessão de dias, horas, momentos.
A fadiga, as preocupações excessivas que eram, são e serão, têm em suas origens outros tantos anos, outros tantos séculos. Brindaremos aos que ainda não vieram. Todos na pauta, como roteiro dos nossos compromissos, não mais que isso. De resto, podemos cantar: “o mesmo banco, na mesma praça, as mesmas flores nos mesmos jardins”. É exatamente isso: nada de novo “acontece no meu coração... quando cruzo a Ipiranga com a Avenida São João”. E tome mais Tropicália - I, II, III... E mais contracultura e “underground”. Pois, ainda não estamos estourando champanhe às barricadas da parisiense revolução de 1968? Em versão Lindberg, yuppie, que é a parte que nos “cabe neste latifúndio”. Ou, será, comemoraremos, ao som de Edith Piaf, a Resistência aos Germanos? E sempre fazendo de conta que saudosamente somos modernos, insistindo em não ver o tempo passar, teimando na idéia de que o velho é melhor que o novo...!? Se assim for, nada começará, porque 1993, 1992, 1889, 1822, 1500 são mais velhos, e - pela absurda lógica - melhores.
Aliás, no fim do túnel existe um poço que não tem fundo; não adianta encontrar nenhum farolete no fim do primeiro quando há abismo no segundo. Preciso é identificar o responsável por tão grotesca construção. E é aí que a coisa pega: nós acreditamos muito mais em trevas do que em lume, e por isso somos todos co-responsáveis pela ocultação das verdades mais imediatas, aquelas que dizem respeito à nossa capacidade de renovar.
Se temos sido incapazes de efetivar mudanças a partir de cada um, continuaremos incapacitados para o exercício da aspiração maior, a democracia. Sem democracia estaremos perpetuando o arcaico em nome de uma suposta tradição, e tradicionalmente festejaremos o formalismo sem conteúdo, mais iludidos que esperançosos. E como esse tipo de esperança é a primeira que mata, morreremos sempre a cada novo ano. (Marcus Moreira Machado)
quinta-feira, 20 de agosto de 2009
SEGUNDA-FEIRA, 24 DE AGOSTO DE 2009: "SUSTENTO"
Só mesmo a xenofobia pode explicar a ignorância do que se convencionou denominar 'intelectualidade de esquerda' entre nós latino-americanos, mais notadamente os brasileiros, ao denunciar os americanos do norte como “ímperialistas” e nada mais.
Se as outrora treze colônias são hoje uma grande nação, a isso muito se deve a crença nas virtudes do trabalho pelos colonizadores anglo-saxões, para quem - como recorda Vianna Moog - mendigos, monges, cenobitas, anacoretas, gente de convento, de ascetismo e de vagabundagem, é gente perdida. Em resumo: crer em Deus exige imediata, firme e robusta crença no labor, consagrando a máxima de personagens tão distintos em épocas e ideais, porém irmanados em comunhão com a maneira única de demonstrar-se a "fé" - "Quem não trabalha não come", disseram Calvino, Lênin e São Paulo.
A "Idade do Mendigo", tão bem descrita por Leo Huberman, parece se repetir nos países de frágil economia. pois, segundo o autor do clássico "História da Riqueza do Homem", Huberman, o número de mendigos nos séculos XVI e XVII era surpreendente, constituindo um quarto da população de Paris na década de 1630. Consequência direta das novas terras então abertas à exploração, a mendicância foi o lado indesejável do aumento das fortunas de mercadores e banqueiros da época, contrariando o que era de se esperar passasse à História "como uma época áurea de prosperidade e felicidade para a humanidade".
Hoje, o que se apresenta como verdadeira inovação em Economia - a desvalorização da moeda - nada mais é que 'um recurso que tem séculos de idade'. "Os reis da Idade Média que desejavam ter o dom de Midas, de transformar tudo em ouro, recorriam à desvalorização da moeda como substitutivo adequado para conseguir dinheiro". Mas, assim como antes, a verdade, porém, é que 'quando o dinheiro se modifica de valor o comércio é afeitado ', com a imediata elevação dos preços e, naturalmente, estimulação da pobreza.
Não sendo admissível uma sociedade moderna, contemporânea, ainda com vestígios da sociedade feudal (constituída em três classes: sacerdotes, guerreiros e trabalhadores, sendo que o homem que trabalhava e produzia para ambas as outras classes), também já não é mais razoável um sindicalismo patrimonialista.
Se entre nós terceiro-mundistas o "rei" ainda provoca a ruína e a miséria generalizada, proporcionando ao mesmo tempo a prosperidade para uns poucos, por outro lado os sindicalistas, renitentes, ainda insistem em tratar a grande empresa moderna como mera 'corporação de artesãos' medievais. Assim é que o sindicalismo pretensamente 'marxista' não observa que proa empresa capitalista "vem tirando o poder do capitalista e o entrega à própria organização ou burocracia", ou seja, à 'tecno-estrutura', evitando a confrontação mais direta com os operários. Como muito acertadamente analisa John K. Galbraith, os sindicatos trabalhistas tornaram-se bem menos revolucionários do que Marx previu ou gostaria que fossem.
Somente sindicalistas xenófobos e, por isso mesmo, ignorantes não enxergam a razão deste que 'universalmente é reconhecido como um dos mais brilhantes economistas do século XX, Galbraith, o autor de "A Era da Incerteza". E, muito infelizmente, o que mais temos na 'representação' da dita "classe trabalhadora" é a manifestação da xenofobia, impedida de considerar a tendência para a criação de um poder compensador, onde os operários facilmente organizados podem perceber o poder das empresas de comprarem o seu trabalho, na regra quase imutável de que onde há grandes empresas controlando seus preços, há fortes sindicatos controlando os preços pelos quais o trabalho é vendido, em vínculo direto com o moderno problema da inflação.
Agora, deplorável mesmo é a pretensa desunião entre governo, empresários e sindicalistas que guardam muita similaridade entre si, quer dizer, buscam, tal qual 'gente de convento', seu sustento na demonstração daqueles que realmente têm fé, e por isso, verdadeiramente trabalham. (Marcus Moreira Machado)
DOMINGO, 23 DE AGOSTO DE 2009:"DO BEM E DO MAL, DE SEMPRE"
Operários e levantes estudantis paravam, em 1968, na França, o país do Marechal De Gaulle. A década dos anos 60, caracterizada em seu início por uma retomada do crescimento econômico a nível internacional, estimulava nos brasileiros uma maior percepção para identificarem o enorme contraste entre a formidável pobreza nacional e a opulência localizada e restrita a poucos outros países. As exigências de transformação se faziam, também, pelo uso da violência.
Ainda em 1968, era assassinado, nos Estados Unidos, Robert Kennedy, sugerindo a ascensão daquele que futuramente seria conhecido como o homem do escândalo de Watergate, Richard Nixon. É também nesse ano que um jovem baiano, Caetano Veloso, assume o seu devido lugar na música popular brasileira, sendo inicialmente vaiado, para, em 1972, trajando uma jardineira e com um saco de palha a tiracolo, de retorno ao Rio de Janeiro, de onde saíra para o exílio em 1969, oferecer "um dos mais extraordinários shows dos últimos tempos no Brasil", assistido por uma imensa legião - os "caetanistas" -, e dando origem a um novo vocabulário, repleto de expressões do tipo "curtição", "barato", "bicho" e "desbundar".
À época, apologistas do autoritarismo recorrem a uma inconsistente "política de integração", como fundamento para a implementação de vultosos empreendimentos, justificando-os pela alegria necessidade de estabelecer vias de comunicação dentro de regiões isoladas, e delas para os "centros dinâmicos do país". Apelam mesmo à interpretação do Professor de Direito e Sociólogo francês Jacques Lambert sobre a estrutura social dos países latino-americanos; são citados "A América Latina" - uma análise das estruturas sociais e políticas do México, Brasil, Venezuela e Colômbia, entendidos como "quatro países retalhos pelo dualismo social" - e "Os Dois Brasis", com destaque para reprodução, no país, dos contrastes verificados no mundo, encontrando-se aspectos que "lembram os de Los Angeles ou Chicago" e os que fazem recordar os da Índia ou do Egito.
Numa enquête sobre a exploração da mão-de-obra infantil, a UNESCO, indignada, denunciava, em 1973, a surpreendente existência de mais de 40 milhões de menores de 14 anos utilizados como trabalhadores em fábricas, na agricultura, em pequenas indústrias, em oficinas de artesanatos, em hotéis, restaurantes e lojas, ou como vendedores ambulantes. A América Latina com a Ásia, África e o Oriente Médio, é apontada como região onde crianças exploradas como mão-de-obra são às vezes vendidas como domésticas, sob o disfarce de adoção.
E enquanto nos EUA crescia a crítica antimilitarista, satirizada em MASH, por Robert Altman, e denuncia-se o absurdo da guerra do Vietnã, no Brasil a pornochanchada dava o tom de uma cultura enfraquecida e com apoio governamental, sujeitando talentos promissores ao auto-exílio, ao passo que, por denúncia de um ex-comunista, os órgãos de segurança detinham um grupo de velhos militares considerados, então, subversivos. O ato Institucional número 5 já completara quatro anos de idade, e o ministro da Fazenda, Antonio Delfim Neto, advertira os americanos contra riscos, ainda que pequenos, de uma política protecionista, proclamando que mesmo países de pequeno significado econômico poderiam atingir setores sensíveis da economia americana.
1973, apontado como o ano de grandes decisões, seria o da sucessão do presidente militar Emílio Garrastazu Médici. Sob o seu governo, instituído após breve período de ministros militares no exercício temporário da presidência, e que se impôs como tarefa " o restabelecimento da democracia", era morto Carlos Marighella, ex-deputado federal e, junto com o Capitão Carlos Lamarca, destacado líder subversivo. A indicação de Médici pelo alto Comando das Forças Armadas para assumir a presidência da República, justamente com o almirante Augusto Rademaker na vice-presidência, anunciara a sua disposição de restaurar a democracia, promover o progresso e a liberdade e reformar as instituições econômicas, sociais e políticas.
À época, instituíra-se o "Fundo para a Namíbia" que, tendo recebido mais de nove milhões de dólares, serviria, em parte, para financiar o Instituto das Nações Unidas para a Namíbia, a ser fundado em Lusaka, em 1976, para formar futuros administradores daquela nação. E, no Brasil, a remuneração do capital (o lucro) das empresas elétricas era considerada maior, em 40%, que a dos Estados Unidos, apontando-se, dentre as dez sociedades que maiores lucros apresentaram em 1970, as Centrais Elétricas de São Paulo, a Light, Furnas e Hidrelétrica do São Francisco; criticava-se a ausência de reinvestimento no setor energético e, em contrapartida, a aplicação dos lucros astronômicos empresas em setores totalmente estranhos, com conseqüente aumento fabuloso no preço da energia para o consumidor.
Bernardo Bertolucci, a exemplo de Pier Paolo Pasolini, embora menos mórbido, preocupava-se com as relações humanas na linguagem cinematográfica, e, pela realização da película famosa, "Último Tango em Paris", de 1972, se tornaria mundialmente conhecido. O brasileiro Nélson Pereira dos Santos, opondo-se à estratégia dos altos financiamentos, procurava e encontrava uma nova linguagem para o cinema nacional através de "Azyllo Muito Louco" ou "O Amuleto de Ogum", não obstante preenchesse o cinema norte-americano a maior parte da programação restante, diante do estrangulamento do mercado brasileiro.
Mais tarde, o já eclético compositor baiano, Caetano Veloso, afirmaria: "Será que nunca faremos senão confirmar / A incompetência da América Católica / Que sempre precisará de ridículos tiranos?"
Parece que foi ontem: o Brasil e no mundo o bem e o mal confundiam-se sob o mesmo lema da democracia. (Marcus Moreira Machado)
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