Ao som de um bolero vienense, valsavam todos um maxixe na corte do rei na barriga. No frenesi, ninguém suspeitava que a seca já não era mais nordestina, castigando agora toda a democracia racial irmanada no projeto de redenção do ser desumano. E chovia tanto lá fora, mas chovia tanto, a ponto de não perceberem que os tempos eram outros, não mais os bons tempos da felicidade geral da nação; se dançavam conforme a música, bailavam sem melodia, pois a orquestra cochilava, exausta de repetir economicamente as mesma seleções. Eis que a voz do Brasil emudece. Geléia geral. Afinal, por que silenciara o brado? E o bardo, por que não trovava as canções à formosura feminina das tropas entrincheiradas no golfo da baía da Guanabara? Estácio de Sá e São Sebastião bem que serviram de exemplo aos incautos sobre o pouco ou nenhum valor das flechas de cupido. Somente um motim explicaria aquelas naus à deriva, sem socorro algum, perdidas no triângulo de vértice apontado para baía dos porcos latinos! Desesperadamente, ao alerta estrondoso acorreu a multidão para o abrigo anti-eleição evitando ser torpedeada pelos napalms de gases paralisantes. Os sobreviventes, lembrando Orwell, revolucionaram em perfeita coalizão com um admirável mundo novo, todo cheio de expectativas, prometedor e cumpridor dos básicos direitos dos sem vale-refeição.
Como explicar o surto de febre verde-amarela contagiando de progresso a desordem na plantação de bananas da república? Obra de acaso? Não. Definitivamente, não. Não se permitiam interpretações doutrinárias, ainda que alicerçadas em decisões jurisprudenciais; o retrocesso seria expurgado a todo custo, exilado aos confins da reduzida mata atlântica, sem direito a verde, sem passagem na ponte aérea dos zepelins e dos "gatos" de TV fechada e da Net. A própria lei da gravidade, bem como a sua irmã siamesa, a da oferta e procura, foram abolidas, para coibir os que levitavam na demanda. Aquela enfermidade, certamente, aparentava ser um resquício de miliciana ditadura, ou melhor, de todas as ditaduras adormecidas no extinto vulcão da cordilheira do planalto do centro-oeste, leste-sul do Trópico por onde morreram na praia tantos projetos faraônicos, inclusive o da muralha separando o gueto favelado da cidadania urbanizada. Ao longe alguém cantarolava despreocupadamente uma nova cantiga de ninar, inspirada, talvez, nos cânticos gregorianos, dos mais modernos papas da mídia eletrônica. Anunciava-se a vinda celestial das ondas sonoras captadas nas antenas de retransmissão dos mais íntimos impulsos passionais, avizinhava-se a salvação pelo sagrado direito à mediação de todo homem livre.
Dito e feito. Nunca mais os trocadilhos seriam a máxima expressão da realidade nacional. Afinal...!
(Caos Markus)