O conceito de cidadania tem origem em três derivações: civil, política e social.
O direito civil está relacionado ao exercício da liberdade individual e suas variantes, como a 'liberdade de ir e vir', de imprensa, pensamento e fé, bem como o direito à propriedade, de concluir contratos válidos, e o acesso à justiça. Assim, as instituições vinculadas aos direitos civis, em função da possibilidade apresentada ao indivíduo em afirmar seus próprios direitos em termos de igualdade com os demais, e devido ao encaminhamento processual, são representadas pelos tribunais de justiça.
O direito político, por outro lado, remete à possibilidade de participar no exercício do 'poder político', seja como membro eleito de um dos organismos integrantes do Estado ou como seu eleitor. Desta forma, tem como instituições correspondentes o parlamento e os conselhos do governo local.
Já o elemento social, por fim, refere-se ao todo, desde o direito a um mínimo de bem-estar econômico e segurança ao direito de participação na herança social e à vida de um ser civilizado de acordo com os padrões prevalecentes na sociedade. A ele estão relacionados o sistema educacional e os serviços sociais.
Do processo de evolução da cidadania, dois são os mais destacados desdobramentos. Primeiramente, a separação funcional permitiu a cada um dos direitos seguir seu caminho, figurando os três como elementos diferentes entre si. A distinção entre eles era tão completa a ponto de se atribuir os estágios individuais de formação a séculos diferentes (os direitos civis ao século XVIII, os políticos ao XIX e os sociais ao XX). Estas etapas devem ser relativizadas, evidentemente, pois há entrelaçamento, principalmente entre as duas últimas.
Secundariamente, houve um distanciamento das corporações, tangentes aos grupos sociais que elas buscavam servir, em função do seu novo caráter nacional, decorrendo daí a necessidade de se reconstruir o mecanismo de acesso àquelas: cada um dos direitos ligava-se à organização cujo mecanismo de alcance foi restituído ao longo dos séculos, paulatinamente, reforçando a completa diferenciação.
As distinções entre ‘cidadania’, ou ‘status’, e ‘classe social’ são também essenciais. A primeira refere-se a um ‘status’ concedido aos membros integrais de uma comunidade. Todos os detentores do ‘status’ são iguais, no que diz respeito aos direitos e obrigações pertinentes a essa condição. Quer dizer, a 'cidadania' é a relação do indivíduo com o Estado, a partir da qual são conferidos direitos individuais num movimento em direção à 'igualdade material' ou à 'cidadania ideal'.
A 'classe social', por seu turno, é um sistema de desigualdade. Relaciona-se com a inserção do sujeito no mercado de trabalho e, num marco liberal, sua existência é desejável: para recompensar o trabalho realizado ou na condição de incentivo ao desenvolvimento. Assim, pode-se assegurar, 'a classe social é fundada nas desigualdades econômicas individuais', enquanto, ao mesmo tempo, subsiste como 'uma reprodutora de desigualdades sociais'.
Cidadania e classe social, por marcante divergência em relação aos seus fins, tomaram a forma de conflito entre princípios opostos. Observado, no século XX, o conflito entre cidadania e sistema de classe capitalista, daí a preocupação em investigar os impactos de uma sobre outra e, eventualmente, entrever alguma espécie de compatibilidade. Ainda assim, os termos continuam a carecer de definições mais concretas.
Entre duas modalidades de classe social, há aspectos relevantes em sua uma diferenciação. O primeiro deles é a classe assentada numa hierarquia de ‘status’: expressa as peculiaridades de um e outro segmento em termos de direitos legais e costumes estabelecidos, dotados do caráter coercitivo essencial à lei, constituindo-se em uma entidade, eclodida, naturalmente, em seu próprio direito. Trata-se, por assim dizer, do modelo de classes predominante no feudalismo medieval, notando-se a incompatibilidade desta configuração com as aspirações de cidadania.
A segunda alteridade de classe social não é tanto um produto obtido de outros institutos, mas resultantes dos fatores vinculados às organizações da propriedade e educação e à estrutura da economia nacional. Permite-se a mobilidade social, associada à participação subjetiva na economia (através do mercado de trabalho), viabilizando o sucesso material. A existência dessa classe gera uma desigualdade social necessária e proposital, ainda que possa se tornar destrutivamente excessiva. Entretanto, a sua necessidade sugere, a princípio, não ser incompatível com aspirações igualitárias via ‘status’. Neste sentido, é aceita explicitamente a pobreza, apesar de deplorar os indigentes ou os destituídos. Porque sem uma grande proporção de pobres não poderia haver ricos, pois estes últimos são o produto do trabalho. A pobreza, portanto, é assim assimilada enquanto ingrediente indispensável à coletividade. Equivaleria a confirmar, a despeito das contradições, a existência de igualdades variadas, pois contidas em diversificação de ‘status’ numa classe determinada da sociedade mais ampla.
O desejo por cidadania e o despertar da consciência social, causas da favorável diminuição da influência classista, não constituem um ataque ao sistema hierarquizado, tornando-o, ao contrário, menos vulnerável. Além disso, singularmente, quando o núcleo da cidadania residia nos direitos civis, a outorga desses direitos era indispensável à manutenção de um mercado competitivo e gerador de desigualdades.
(Caos Markus)
O direito civil está relacionado ao exercício da liberdade individual e suas variantes, como a 'liberdade de ir e vir', de imprensa, pensamento e fé, bem como o direito à propriedade, de concluir contratos válidos, e o acesso à justiça. Assim, as instituições vinculadas aos direitos civis, em função da possibilidade apresentada ao indivíduo em afirmar seus próprios direitos em termos de igualdade com os demais, e devido ao encaminhamento processual, são representadas pelos tribunais de justiça.
O direito político, por outro lado, remete à possibilidade de participar no exercício do 'poder político', seja como membro eleito de um dos organismos integrantes do Estado ou como seu eleitor. Desta forma, tem como instituições correspondentes o parlamento e os conselhos do governo local.
Já o elemento social, por fim, refere-se ao todo, desde o direito a um mínimo de bem-estar econômico e segurança ao direito de participação na herança social e à vida de um ser civilizado de acordo com os padrões prevalecentes na sociedade. A ele estão relacionados o sistema educacional e os serviços sociais.
Do processo de evolução da cidadania, dois são os mais destacados desdobramentos. Primeiramente, a separação funcional permitiu a cada um dos direitos seguir seu caminho, figurando os três como elementos diferentes entre si. A distinção entre eles era tão completa a ponto de se atribuir os estágios individuais de formação a séculos diferentes (os direitos civis ao século XVIII, os políticos ao XIX e os sociais ao XX). Estas etapas devem ser relativizadas, evidentemente, pois há entrelaçamento, principalmente entre as duas últimas.
Secundariamente, houve um distanciamento das corporações, tangentes aos grupos sociais que elas buscavam servir, em função do seu novo caráter nacional, decorrendo daí a necessidade de se reconstruir o mecanismo de acesso àquelas: cada um dos direitos ligava-se à organização cujo mecanismo de alcance foi restituído ao longo dos séculos, paulatinamente, reforçando a completa diferenciação.
As distinções entre ‘cidadania’, ou ‘status’, e ‘classe social’ são também essenciais. A primeira refere-se a um ‘status’ concedido aos membros integrais de uma comunidade. Todos os detentores do ‘status’ são iguais, no que diz respeito aos direitos e obrigações pertinentes a essa condição. Quer dizer, a 'cidadania' é a relação do indivíduo com o Estado, a partir da qual são conferidos direitos individuais num movimento em direção à 'igualdade material' ou à 'cidadania ideal'.
A 'classe social', por seu turno, é um sistema de desigualdade. Relaciona-se com a inserção do sujeito no mercado de trabalho e, num marco liberal, sua existência é desejável: para recompensar o trabalho realizado ou na condição de incentivo ao desenvolvimento. Assim, pode-se assegurar, 'a classe social é fundada nas desigualdades econômicas individuais', enquanto, ao mesmo tempo, subsiste como 'uma reprodutora de desigualdades sociais'.
Cidadania e classe social, por marcante divergência em relação aos seus fins, tomaram a forma de conflito entre princípios opostos. Observado, no século XX, o conflito entre cidadania e sistema de classe capitalista, daí a preocupação em investigar os impactos de uma sobre outra e, eventualmente, entrever alguma espécie de compatibilidade. Ainda assim, os termos continuam a carecer de definições mais concretas.
Entre duas modalidades de classe social, há aspectos relevantes em sua uma diferenciação. O primeiro deles é a classe assentada numa hierarquia de ‘status’: expressa as peculiaridades de um e outro segmento em termos de direitos legais e costumes estabelecidos, dotados do caráter coercitivo essencial à lei, constituindo-se em uma entidade, eclodida, naturalmente, em seu próprio direito. Trata-se, por assim dizer, do modelo de classes predominante no feudalismo medieval, notando-se a incompatibilidade desta configuração com as aspirações de cidadania.
A segunda alteridade de classe social não é tanto um produto obtido de outros institutos, mas resultantes dos fatores vinculados às organizações da propriedade e educação e à estrutura da economia nacional. Permite-se a mobilidade social, associada à participação subjetiva na economia (através do mercado de trabalho), viabilizando o sucesso material. A existência dessa classe gera uma desigualdade social necessária e proposital, ainda que possa se tornar destrutivamente excessiva. Entretanto, a sua necessidade sugere, a princípio, não ser incompatível com aspirações igualitárias via ‘status’. Neste sentido, é aceita explicitamente a pobreza, apesar de deplorar os indigentes ou os destituídos. Porque sem uma grande proporção de pobres não poderia haver ricos, pois estes últimos são o produto do trabalho. A pobreza, portanto, é assim assimilada enquanto ingrediente indispensável à coletividade. Equivaleria a confirmar, a despeito das contradições, a existência de igualdades variadas, pois contidas em diversificação de ‘status’ numa classe determinada da sociedade mais ampla.
O desejo por cidadania e o despertar da consciência social, causas da favorável diminuição da influência classista, não constituem um ataque ao sistema hierarquizado, tornando-o, ao contrário, menos vulnerável. Além disso, singularmente, quando o núcleo da cidadania residia nos direitos civis, a outorga desses direitos era indispensável à manutenção de um mercado competitivo e gerador de desigualdades.
(Caos Markus)