O contexto cultural no qual desenvolveu-se a filosofia platônica demonstra a problemática política como precípua preocupação da sua Academia. Assistiu Platão em sua época a tirania dos trinta, a condenação e a morte de Sócrates, entre tantos outros fatos que evidenciaram ao filósofo a fragilidade da idéia de justiça nos governos helênicos. E na sua “República” Platão manifesta, pois, princípios básicos a propósito da justiça e do direito idealizando o Estado modelo. Idealista, buscou incessantemente a correlação entre as formas e a realidade, apresentando o homem e o Estado em paralelismo e “sendo o Estado um homem em ponto grande – o macroântropos – com características fundamentais idênticas às do homem ideal em ponto pequeno.
Uma outra coisa, além dos conflitos do seu tempo, estimulou, talvez, o espírito de Platão nessa direção. Na época de Péricles, Atenas fundara muitas colônias além-mar, e a fundação dessas cidades familiarizara os homens com a idéia de que a comunidade não nasce e cresce apenas, mas pode ser feita. E nessa comunidade, entendida como o próprio Estado, existiram, segundo Platão, três classes: a dos sábios, a dos guerreiros e a dos comerciantes, operários e artesãos. A missão da primeira, cuja virtude é a sabedoria, reveste-se da execução do governo, sendo a da segunda, para qual a virtude é a coragem, a de defender o Estado, e a terceira, tendo por virtude a sobriedade, a de nutrir os defensores do organismo estatal.
Depreende-se do entendimento de Platão para o Estado que o objetivo do organismo político é usufruir o indivíduo da felicidade coletiva, decorrente da realização individual através do trabalho, ou seja, fazendo parte da “polis” o indivíduo cumpria a sua função social, que consiste na razão de ser do homem. A divisão em classes não obedece outro critério senão o da repartição do trabalho, de maneira racional. Por isso, face aos fundamentos metafísicos presentes, o Direito Natural em Platão constitui-se na disciplina jurídica do Estado utópico. O Direito Natural informa a teoria política de Platão de forma substancial, sendo que o direito positivo ou convencional somente angariaria efetiva validade se ajustado à essência do Direito Natural, visto traduzir a própria idéia de justiça. Concepções como a de Platão, mesmo utópicas, requerem e produzem reformas sociais radicais.Platão defende a entrega do comando da administração estatal para os mais sábios porque, estando o intelecto associado com as necessidades de transformação e criação de um ente social, seriam estes os mais capazes para gerir o bem comum e a justiça, ao mesmo tempo em que fomentariam a imprescindível libertação de consciência. Por efeito, justificada resta a relevância do processo educativo dada por Platão, considerando que a educação comunitária é a responsável pela formação das classes, segundo cada função social das mesmas, de acordo com as virtudes específicas correspondentes a cada segmento. Por conseguinte, a formação do indivíduo é pertinente às atividades da classe a que ele pertence, mas nem por isso qualquer uma delas exercerá papel preponderante no ato de usufruir da felicidade coletiva.
(Marcus Moreira Machado)
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