No conflito entre a Igreja e o Império, o monarca, nos séculos XIII e XIV, se julga continuador dos cesares romanos. A multiplicidade dos feudos, porém, não lhes permite vida longa. As vilas, ricas, compram aos “ suzeranos” o direito de livre- administração: são as comunas do século XIII, que elegem os próprios magistrados, segundo o exemplo greco-romano. O rei vale-se desses minúsculos Estados, em conseqüência das levas de cavaleiros para as cruzadas, e do progresso das populações “burguesas” (dos “burgos”que se emancipam), para impor a esses feudos uma disciplina voltada à união. As nacionalidades formam-se pela concentração da autoridade, pela sujeição dos aristocratas isolados em seus castelos, pelo reconhecimento do poder central, capaz de assegurar a tranqüilidade econômica, a ordem civil, no âmbito sempre crescente da expansão de sua raça. As concentrações monárquicas resultam de guerras habilmente ganhas pelos reis, como também pelas concepções de ordem, de civilização, de “cidade”, que infiltram-se e generalizam os costumes. Então, torna a Igreja a emprestar o seu concurso, dessa feita, auxiliando decisivamente esse trabalho unificador, dando à pessoa do rei um caráter sagrado, à sua autoridade uma razão divina, à sua justiça um conteúdo religioso. A história explica o resto: a aproximação dos núcleos culturais pela identidade de língua, sentimento nacional, novas tendências econômicas, não mais militares, da vida coletiva.
Assim, se por um lado Portugal, por exemplo, não conheceu o feudalismo, na Alemanha, entretanto, ainda na Guerra dos Trinta Anos, mais de trezentos Estados conservavam a desagregação medieval. Os “forais” dos portugueses, enquanto isso, definiam a autonomia das suas terras; e em 1350, o país todo estava dividido em municípios, com os seus conselhos, formando a nacionalidade, não tendo o rei consentido que os nobres usurpassem os direitos municipais; aí a unidade nacional coincide com o estabelecimento da monarquia. A realeza que funda o Estado moderno associa-se às concepções latina e feudal da autoridade: “imperium” e “senhoriagem”. Do fato –supremacia do soberano– se chega ao direito –a declaração da “soberania”– como atributo do Estado, mas personificada no rei. Por essa idéia de poder público nenhuma autoridade é superior à do monarca, e ele a desfruta como representante de Deus para manter os homens em cristã sociedade. A origem de sua força é “providencial”: realiza a ordem que agrada a Deus e assegura o culto. Apropriadamente à situação dessas monarquias, poderosas, trata-se do poder absoluto e perpétuo de uma república (Estado), caracterizado, por vontade suprema, sem superior que a limite. Na verdade, repete-se a evolução da autoridade, vista antes em Roma e Grécia: o poder dividido e restrito simplifica-se, totaliza-se; e o soberano é absoluto. E como tal será conservada até a Revolução Francesa.
(Marcus Moreira Machado)
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