REMETENTE e DESTINATÁRIO alternam-se em TESES e ANTÍTESES. O ANTAGONISMO das CONTRADITAS alçando vôo à INTANGÍVEL verdade.
sexta-feira, 4 de dezembro de 2009
QUINTA-FEIRA, 17 DE DEZEMBRO DE 2009:"VALORAÇÃO"
Vivo assediado por pessoas bem intencionadas. Eu mesmo sou deveras bem intencionado, mesmo sabendo que entre intenção e gesto há uma distância muito grande.
Já acreditei em muita coisa, até em Nietzsche, que em pouca coisa acreditava. Procurei uma verdade mais permanente, que não a de “um batalhão móvel de metáforas, metonímias, antroporfismos... enfatizadas poética e retoricamente”. Nos “arquétipos” de Jung procurei explicação para o primata que de quando em quando se revela em cada um de nós, na barbárie que todos cometemos dia após dia. Aderindo à teoria economicista, pensei encontrar refúgio na história, e nela poder intervir, não como coadjuvante e sim protagonizando-a.
Sociólogo de botequim, exaltei Durkheim no tempero existencialista de Camus, negando valores e inventando outros tantos.
Não fui o único; não sou o único. Muitos quiseram - e ainda insistem em querer - a paz, substituindo os horrores e a infâmia das guerras pela majestade do amor. Utopia, acreditávamos, não existia; era questão de tempo. Como o tempo insistia em não chegar, ouvimos Krishnamúrti, desistindo, então, de um aprendizado que nos libertasse da nossa miséria, renunciando a ensinamentos vários sobre o caminho libertador de um pensamento ou de uma prática qualquer; procuramos revelar-nos a nós mesmos, a fim de que pudéssemos ver o que éramos e depois esquecer-nos; enfim, pretendêramos sair do ego, chegar à criatividade pela visão do nosso vazio e descobrir, simultaneamente, o amor.
Balela, muita balela! Nossas boas intenções nada mais fizeram que ocultar a omissão dos nossos gestos.
Ainda hoje, não damos esmolas para não estimularmos a mendicância, e condenamos à morte os miseráveis como exemplo, no cínico e absurdo contraste entre a suposta indolência dos despossuídos e a obstinação dos bem sucedidos.
Se sou incapaz de gestos, não mais quero me capacitar com intenções. Seguir a máxima de São Tiago: “Pratica tua fé com obras”, deveria ser a única boa intenção de todos quantos proclamam um mundo melhor. Irreligioso que sou, entendo como verdadeiro o significado de “eclesias” para determinar o sentido de Igreja, ou seja, um sentimento e uma conduta de dentro para fora de nós mesmos. E vejo assim que se “sem a justiça, os Estados não passam de bandos organizados de ladrões”, como asseverou Santo Agostinho, e se entre nós o clamor geral é pela justiça, esta só se fará presente quando indentificarmos todos, em ações positivas, aquilo que deverá vir de dentro para fora de nós mesmos. O que vale dizer que Igreja e Estado, instituições autônomas, urgem ser revitalizadas em suas “práxis”. Não podemos mais nos esconder sob o manto das estruturas políticas dessas organizações sem incorrermos no risco de discursar no vazio, de clamar no deserto.
Para ser sincero, não sei a quem cabe minha reflexão, ou se ela é mesmo reflexão. Talvez não seja mais que uma advertência, a mim e a todos quantos se batem pelas intenções. Ou, se nada disso, Zoroastro estava mais certo, ao afirmar o renascimento pelo caos.
Se assim for, o nihilismo é substrato para o marco zero, indispensável para renascer das cinzas a fênix libertadora.
Certo é que algo de humano há em nós, ainda que sejamos políticos, religiosos; indubitável que anterior às nossa condições sociais, muito antes de defendermos quaisquer teorias, um sentimento comum nos unia. Se o medo do desconhecido, se o instinto de preservação da própria espécie, não faz diferença; não nos dizimávamos, e nem intenções tínhamos, boas ou más. Éramos puro gesto, e puro gênio. Somos, agora, nada mais que resto nos propósitos estóicos ou altruístas desprovidos de pragmatismo.
A verdade do valor prático é a verdade imediata que edifica. Dela poderemos nos orgulhar, pois nela veremos as obras, antes promessas escudadas no valor empírico de uma vaga e incerta nobreza de espírito, outrora sublimadas na minha, na sua, na nossa boa intenção.
(Marcus Moreira Machado)
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