(Marcus Moreira Machado)
REMETENTE e DESTINATÁRIO alternam-se em TESES e ANTÍTESES. O ANTAGONISMO das CONTRADITAS alçando vôo à INTANGÍVEL verdade.
sexta-feira, 4 de dezembro de 2009
DOMINGO, 13 DE DEZEMBRO DE 2009: "COLÓQUIO"
Madrugada adentro, na insônia que insiste em me fazer vigilante, recebido eu tenho visitas inesperadas. Noite dessas, Barbosa, o Ruy, me fez severa advertência: “pesai bem que vos ides consagrar à lei, num país onde a lei absolutamente não exprime o consentimento da maioria, onde são as minorias, as oligarquias mais acanhadas, mais impopulares e menos respeitáveis as que põem e dispõem, as que mandam e desmandam em tudo; a saber: num país onde, verdadeiramente, não há lei, não há moral, política ou juridicamente falando”.
Ruy, ponderei, os tempos são outros.
Sou colhido de surpresa com a entrada em meu escritório de um poeta (seria um amigo de Barbosa?) por mim desconhecido. Com a certeza de que o clamor de justiça se perde no espaço e no tempo, cantou o “menestrel”:
“Há dois mil anos te mandei meu grito,
Que embalde, desde então, corre o infinito”.
Perdendo a noção do tempo, um tanto entusiasmado com o bate-papo, retruquei: vocês são por demais pessimistas, e certamente deixaram de acreditar no Estado como forma da organização nacional.
Subitamente, acorreu em defesa dos meus visitantes, o doutrinador Luis Racasens Siches. Com veemência singular dirigiu-me a sua preleção: “O grande erro cometido pelo transpersonalismo é o seguinte: não se dá conta de que a coletividade não tem realidade substantiva, de que não tem um ser por si e para si mesma, independente do ser dos indivíduos que a compõem. Em troca, o ser do indivíduo consiste num ser por si e para si mesmo, num ser autônomo e independente. Por isso, a coletividade deve respeitar o indivíduo, no modo de ser peculiar deste, nos valores próprios que lhe são destinados, e reconhecer a sua autonomia. O indivíduo não é pura e simplesmente uma parte do todo, ele é superior à sociedade, porque é pessoa no pleno e autêntico sentido desta idéia. A coletividade careceria de sentido se não se afirmasse como um meio para o indivíduo”.
Atento, eu ainda resistia aos brilhantes argumentos. Ouçam-se, meus amigos. Estou sinceramente feliz com a visita que me fazem, mas será mesmo que isso tudo se aplica, em caso concreto, ao Brasil? Cá em nosso país, o Estado adota a concepção personalística, sendo, então, apenas um meio posto à disposição da pessoa humana do brasileiro? Vocês parecem querer me sugerir que o problema é político, como sendo ele o causador da má administração brasileira.
Quase que em uníssono, sou interpelado:
“A política repercute na administração, em qualquer tempo. Mas, hoje ela tem substituído a própria administração. Observe, Marcus. A majoração dos salários (o mínimo geral ou profissional, os de certas categorias econômicas, a lapsos cada vez menores) tem repercutido imediata e intensamente nos custos industriais e comerciais, consumindo logo, na voracidade inflacionária, o aumento demagógica e ilusoriamente concedido. É claro que, em tal clima, se torna impossível administrar com fecundidade”.
Eis que um novo visitante, desta vez um militar, Castelo Branco, bastante entusiasmado com a direção tomada na conversa, faz - com discreta gravidade - uma lembrança a nós todos. Ouvimos, com prudência: “O preço da liberdade é a eterna vigilância”.
Cinco da manhã, eu ali, na maior e absoluta vigília. Momentânea pausa entre um café e um cigarro.
Santo Tomás de Aquino, recém chegado, quer esclarecer: “O social e o político são atributos da essência humana na sua universalidade concreta. Não se pode compreender o indivíduo sem o Estado nem o Estado sem o indivíduo. O Estado é apenas um ser distinto dos indivíduos e nada mais; é uma espécie de corpo místico, como a Igreja”.
Um tanto confuso, um tanto cansado, o sono chegando, pergunto ao Ruy o que ele afinal recomenda. Sereno, Ruy me diz: “Não ser baixo com os grandes, nem arrogante com os miseráveis. Amar a Pátria, estremecer o próximo, guardar Fé em Deus, na verdade e no bem.
Deixei-os ainda conversando. Fui dormir.
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