O Brasil ainda terá muito tempo pela frente para se ver definitivamente livre da ignorância e do preconceito que, contraditoriamente, o colocam nas páginas dos jornais como um exemplo maior de subdesenvolvimento social. E, alheios a qualquer crescimento, ansiosos apenas por angariar dos dividendos a maior parcela, não verão os brasileiros, nem as crianças nem os adolescentes, mais que um final de festa, assim que acenderem as luzes daquela que, precipitadamente, julgam ser uma comemoração.
Se já não é momento para rostos sisudos, expressão natural de quem sempre apostou no fracasso e no pessimismo, também não é hora para festejos descabidos. O que se opera entre nós é o estabelecimento de uma firme convicção em nosso potencial; fortalecer as estruturas dessa proposição, no entanto, requer equilíbrio e moderação, algo a que não estamos habituados. Por isso, então, a exigência de cautela, a mesma que faz dos povos do mundo civilizado pessoas compromissadas com um futuro distante, integrante, porém, dos destinos de um país e das gerações vindouras.
Se há algum característico que deva ser imediatamente extirpado do caráter brasileiro, esse é o do individualismo. Não confundindo-o com individualidade (essa, a ser preservada em quaisquer circinstâncias), o egocêntrico haverá de sucumbir, substituído pelo sentimento mais elevado da solidariedade. Pois, enquanto a cumplicidade der o tom das relações em sociedade, inadmissível será apontar uma ínfima parcela da população nacional como representante corrente de opinião; não há que se falar em conjeturas desse ou daquele segmento social como o sendo o pensamento abrangente de um todo, quando, na verdade, a esmagadora maioria se desfaz ante a estratificação social acentuada e desagregadora.
A resistência a mudanças implica ou em manutenção de privilégios ou em passividade e conformismo. Nem uma e nem outra, a qualidade desejável será sempre a da transigência como pressuposto da transformação efetiva. E a felicidade, assim, deverá ser compreendida como objetivo a ser atingido muito mais pelo trabalho e pela obstinação que pela plácida contemplação daquilo que por outros foi realizado.
O próprio país é vários brasis, onde, enquanto num deles a maioridade conquista-se com a gorda mesada do pai, noutro a emancipação é bastante antecipada pela contingência da miserabilidade, exigindo de crianças e adolescentes um compromisso com outra felicidade, muito mais efêmera, porém muito mais urgente - a da particular sobrevivência.
(Marcus Moreira Machado)
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