O desenvolvimento de uma cultura que abusivamente se apropria dos medos a torna, por si própria, uma 'cultura de medo', cuja visibilidade amplia-se nas mais diversificadas fontes de poder, com padrões de expressividade em variadas áreas da vida social e humana.
Sim, o medo faz parte da existência humana como forma de precaução face ao desconhecido. Por isso, é um mecanismo básico de preservação e de sobrevivência da espécie.
Há, no entanto, um outro medo: o medo criado e desenvolvido pelos homens; o medo que se constitui em padrão; por consequência, um produto cultural, quando transformado em valores e símbolos partilhados por coletividades.
O desenvolvimento de uma 'cultura de medo', disseminado entre nós pelos meios de entretenimento e de cultura massificada, como o cinema, as programações televisivas, DVDs e outros 'instrumentos de jogos' (na Net, por exemplo), apreendidos pelas crianças e por adolescentes nas fases mais críticas do processo de socialização, poderá ser um dos fatores com maior expressividade nos índices de insegurança e de violência manifestados paulatinamente, e de forma sempre mais estruturada, por uma parcela substancial de indivíduos.
Não se sabe, do ponto de vista científico, até que ponto a sua incorporação terá efeitos a longo prazo nos sistemas cognitivos e emocionais das audiências de mais tenra idade, ou em personalidades de maior fragilidade.
A construção de uma 'cultura de medo' passa pela exploração dos aspectos de insegurança reservados no mais recôndito de cada individualidade.
E quanto mais vulneráveis forem os indivíduos, maior será, por efeito, a intensidade da 'emoção do medo'.
Os meios de comunicação social não abrem mão de -regular e insistentemente- divulgar imagens de violência e de pânico, tendo por exclusiva intenção (de maneira apelativa e muitas vezes abusiva) ilustrarem ou imprimirem uma dinâmica mais convincente às suas notícias. A repetição consecutiva dos mesmos quadros, não raramente de horror, a fim de conquistar ou manter audiências, invoca o medo, propagando-o sem reservas.
A manipulação dos sentimentos de insegurança e de incerteza quanto ao futuro da vida das pessoas tem sido gradualmente introduzida em nossa cultura e sorrateiramente entranha-se nos nossos hábitos e percepções.
Procura-se conhecer e antecipar o futuro: o nosso e o dos outros. Pessoas comuns, empresários, políticos e estrelas dos milionários espetáculos recorrem sucessivamente a subterfúgios e malabarismos, na ânsia de controlarem e comandarem as suas vidas e o seu porvir, através da pretendida antecipação do que lhes possa acontecer.
Muito possivelmente por causa deste engendrado sistema, nota-se, é crescente a influência das "pesquisas" e dos "indicadores" nas opções e nas decisões políticas.
A 'ação política' progressivamente afasta-se das utopias, dos ideais, das ideias e dos projetos, cedendo lugar a uma ação absolutamente desprovida de conteúdo programático.
Ao contrário, está assentada na 'sondagem' do eleitorado, ou seja, na 'previsão'.
O que lhe interessa é agradar ao maior número de eleitores e ferir o menor número de
suscetibilidades.
Este mecanismo oculta sua perversidade, porque não é mais meta da política solucionar problemas, mas, sim, resta-lhe o claro objetivo de seduzir os eleitores, fugindo desta forma ao confronto e à luta de ideias e de projetos.
(Caos Markus)
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