A nossa história terminou.
Zoologicamente, nós constituímos uma família - a primeira na ordem dos primatas, e também a primeira na classe dos mamíferos. Mas a nossa família divide-se em grupos, onde a observação encontra diferenças maiores para isolarem as variedades, para dar origem ao que se chama espécies.
Desde que se admita o princípio da transformação evolutiva, a expressão “espécie” designa apenas um momento de individualização relativa mais pronunciada, e não um tipo absoluto imutavelmente constante; e, assim é permitido reconhecer entre os homens diferenças tão graves como as que dividem outras espécies.
As divergências irredutíveis dos mais característicos tipos de homens possibilitam a existência de um homem intermediário, sem fala e sem pensamento.
Quando os homens se dispersaram eram apenas um esboço que, posteriormente, desenvolveu-se em espécies dissemelhantes. Se assim não tivesse sido, seria impossível encontrar nos diversos homens diferença tão profundas a admitirem a sua divisão em espécies.
A irredutibilidade dos vários tipos linguísticos é um argumento capital em favor da dispersão precedente à conformação definitiva das diversas espécies humanas.
Desde que a palavra “espécie” perdeu, com o transformismo, o valor metafísico que possuía; desde que por outro lado o transformismo deu ao homem uma ascendência natural, surgiu a questão de determinar o número exato das espécies humanas atuais.
Formados os primitivos tipos humanos dotados de fala, cada um deles se dividirá em variedades, denominadas “raças históricas”, para cuja formação concorrem, além da ação do clima, (afora os cruzamentos), as próprias instituições e os acasos e condições da existência de cada qual. Cada uma destas raças subdivide-se, por sua vez, em agrupamentos chamados de “povos”, e a que frequentemente corresponde uma organização politicamente autônoma, dando origem às nacionalidades.
Já vivendo o homem em sociedade, a ação das condições do meio ambiente e a dos agentes artificialmente criados pela vida nova que o homem criou para si, não muito mais fortes do que outras quaisquer. Outros caracteres, no caso, subalternizam-se. Não são, portanto caracteres anatômicos que distiguem raças históricas, mas, verdadeiramente, essa classificação ocorre em função dos caracteres morais, das línguas, dos mitos religiosos, dos símbolos jurídicos, das criações poéticas, das tradições nacionais. São nas condições mesológicas, isto é, nas relações entre os seres e o seu meio ambiente, como também nas condições sociais que deve-se buscar as causas dos fenômenos históricos.
Inquestionavelmente, a maior ou menor capacidade intelectual das raças é consequência do grau de sua civilização. Pois, a partir do momento em que se considerem formadas as primeiras raças humanas, a vida posterior da humanidade é norteada pelos motivos sociais que predominam sobre os naturais. São as línguas que assumem, então, o papel de índice característico dessa primeira divisão da humanidade; na sua constituição, vemos a transição da esfera natural para a racional.
Nas nações cultas, a indústria corrige as imposições do meio, e a filosofia modifica a natureza espontânea das manifestações morais. Há uma razão e uma consciência eminente que se traduzem em atos livres, com os quais se alteram os elementos naturais; e a sociedade, com a sua economia, com o seu direito, é um mecanismo animado por uma vontade coletiva mais ou menos consciente. Consideradas todas as formulações feitas até o momento, é de se perguntar: o povo brasileiro já detém uma linguagem própria a permitir-lhe as criações racionais? O povo brasileiro possui o princípio ativo e eminente da existência das sociedades ocultas? Ou, ainda está a situar-se em fase intermediária, na ressonância das vozes do aquém?
Responder a estas indagações seria determinar se o povo brasileiro já fez o longo percurso - em sucessivas manifestações - do movimento até a fala, e desta ao pensamento articulado.(Marcus Moreira Machado)
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