Quando os trabalhadores estão convictos de que a atual distribuição de riquezas é injusta; quando -na organização de um partido político- os trabalhadores afirmam e divulgam que o sistema vigente de propriedade particular é, além de injusto, incompatível com a riqueza potencial que eles têm a partilhar; quando os trabalhadores estão extremamente convencidos de que a sua miséria é causada pelo sistema de governo em vigor; quando os trabalhadores insistem em proclamar que já tentaram reorganizar as instituições políticas, sem que lhes fosse possível racionalizar as condições sociais; podemos então conjecturar que não faltam os elementos necessários para a fundamental transformação da sociedade.
O que vemos, aqui, entretanto, é a ausência de imaginação dos governantes. Eles não sabem e não querem considerar o pensamento dos seus críticos.E, por efeito, temos os seus limites na auto-crítica. Incapazes a grandes concessões, demonstram fraqueza peculiar à "ordem ameaçada", tanto quanto a inabilidade no conhecimento de quanto e em que devem ceder. Temem mudanças estruturais porque, em parte, habituados à cultura política da perpetuação no poder, acreditam que o pacto final com a História já foi consumado; e, também, porque o medo do desconhecido os inibe à faculdade de raciocinar claramente. Inevitável consequência, no momento da indispensabilidade de sua segurança, pressuposto para conduzir a nação além dos limites a que estão acostumados a considerar como garantidos, insistem os governantes em permanecer dentro dessas mesmas confinadas 'fronteiras'. Não concebem a segurança senão em seus próprios termos.
Ora, a fim de manterem tal tênue segurança, esses dirigentes precisam fazer uma de três coisas: devem ser capazes de desenvolver um 'restabelecimento' até o limite em que desapareça a descrença em sua própria capacidade de governar com êxito; ou então devem aniquilar toda a democracia como costumeiro veículo de expressão política, a fim de atacarem as instituições históricas da classe trabalhadora, através das quais a descrença na sua capacidade para governar tem sido organizada e chamada a se manifestar; ou, em última análise, devem promover transformações estruturais permissivas de adaptação das relações de produção às próprias forças produtivas. Ou seja, necessitam pôr em prática um raro fenômeno histórico -uma revolução consentida.
O que de fato todos precisamos é identificar quais as causas profundas e impessoais deste inegável conflito, para não mais atribuí-lo exclusivamente à vontade caprichosa de homens de má-fé. E esse conhecimento só será viabilizado após investimentos numa educação melhor adaptada ao caráter do nosso tempo, vez que grande parcela da população (onde se incluem os próprios governantes) não é atingida pela herança cultural do país, seguindo vida afora inconsciente das forças que regem o seu destino, presa fácil nas crises administradas com receitas paliativas, frequentemente persuadida de que ela própria é a responsável por seus males.
Resta claro o interesse noutra perpetuação, a da ignorância. Ignorância da qual podemos nos livrar combatendo este interesse, sem esperar que a auto-crítica governamental manifeste alguma disposição em sair dos seus estreitos limites.
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