'Estrangeiro': -Imagina que um leigo é capaz de dar conselhos a um médico. Não devemos chamá-lo pelo mesmo nome que damos a esse profissional?
'Jovem Sócrates': -Sim.
'Estrangeiro': -Pois bem, se um cidadão qualquer é capaz de dar conselhos ao soberano de um país, não poderemos dizer que nele existe a ciência que o próprio soberano deveria ter?.
'Jovem Sócrates': -Sim, poderemos.
'Estrangeiro': -Mas a ciência de um verdadeiro rei, não é a ciência própria do rei?
'Jovem Sócrates': -Sim.
'Estrangeiro': -E aquele que a tiver, sendo rei ou simplesmente cidadão, não terá direito, em virtude de sua arte, ao título real?
'Jovem Sócrates': -Certamente que sim.
Este diálogo, extraído de "O Político", de Platão, busca determinar a natureza do político e, através dessa natureza, o caráter da própria política. Para o filósofo de "A República", a política é uma ciência e, também, a mais nobre das artes, aquela que dá felicidade aos homens. E ao distinguir em "O Político" cinco espécies de formas de governo, faz referência à 'democracia' como o domínio da multidão que "em tudo é fraco, sem grande poder tanto para o bem como para o mal, em comparação com outros (governos), porque (nele) os poderes estão divididos entre muitas pessoas".
Transportando-nos da vida política de Athenas de então, para a "a mais grave ignorância em matéria de política" constatada no Brasil atual, concordaremos que o verdadeiro homem de Estado é o "filósofo", isto é, o homem dotado de conhecimentos, como assevera o pensador grego; e lamentaremos, por efeito, a triste conclusão: não há política neste país, onde o governado se vê no espelho do governante; e a nossa democracia tem sido exercida por aqueles "que imaginam possuir esta ciência em todas as suas minúcias", ainda mais exatamente que os demais.
Insiste o 'Estrangeiro': "-Quando pensamos em dirigentes, no exercício de alguma direção, não vemos também que as suas ordens têm sempre como finalidade alguma coisa a ser produzida?"
Partindo da singela analogia de que um governante é um pastor de homens, e que cabe a ele alimentar seu rebanho, lamentaremos outra vez: não governantes neste país, pois que falta-lhes direção e nada é produzido para real satisfação do povo brasileiro.
É fundamental, via de consequência, que encontremos o caminho pelo qual possamos chegar à compreensão do que é 'o político', diferenciando-o, dele determinando o atributo, para, a seguir, dar aos 'atalhos' que dele se afastam um só caráter, específico a eles todos, aos que não são 'o político'. Ou correremos o risco de confundir a arte do governante com ficção do intérprete, do patrão, do "profeta", do arauto, e de outros tantos semelhantes entre si; e desse risco, um outro, o de, na confusão, obedecer a um poder diretivo estranho e alheio à ciência política.
Hoje, não por razão outra é costumeiro ouvirmos: "Não gosto de política". Quem não gosta de "política", ou não sabe o que de fato ela é, ou apenas vê a si próprio quando imagina ter enxergado o seu governante.(Marcus Moreira Machado)
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