Tolstói explica porque, em seu parecer, "A Ciência pela Ciência" é uma absurda concepção.
Ora, nós não podemos conhecer todas as obras, já que o seu número é, pode-se dizer, infinito. Portanto, é preciso escolher. Mas, podemos fazer essa seleção sobre o simples capricho da curiosidade? Não será mais importante deixar-nos guiar pela utilidade, por necessidades práticas e sobretudo morais? Afinal, não temos outra ocupação mais interessante que a de contar a quantidade de estrelas existentes em torno da Terra?
Indubitável, para Tolstói a palavra utilizada não possui o sentido que se lhe atribuem os homens de negócio e, com eles, a maioria de nossos contemporâneos. Preocupa-se pouco com as aplicações da indústria, as maravilhas da eletricidade ou do automobilismo, considerando-os mais como o obstáculos ao progresso moral. O útil é então só o que pode melhorar o homem.
Contudo, ponderando, nem uma coisa nem outra. Nem esta plutocracia ávida e limitada, nem essa democracia virtuosa e medíocre, ocupada tão-somente em expor o maximalismo da "esquerda", democracia na qual viveriam sábios na ociosidade, que, evitando os excessos, morreriam não de enfermidade, porém, de tédio. Todavia, esse essa é questão de gostos, desinteressante a qualquer discussão.
Por outro vértice, não deixa de subsistir o problema a merecer toda atenção: se a nossa escolha não deve ser determinada pelo capricho ou pela utilidade imediata, não haverá ciência pela ciência, e, via de consequência, inexistirá a própria ciência. E isso é verdade? Não há dúvida, outra escolha deve haver; qualquer que seja atividade e obras, os acontecimento são mais céleres que os nossos passos, sem que jamais possamos alcançá-los. Ao tempo em que um sábio se empenha a "descobrir" uma obra, se produzem milhões de outras em cada parte do seu corpo. Querer encerrar a Natureza na ciência seria pretender encaixar o todo na parte. Pois os sábios acreditam na criteriosa hierarquia de feitos. E têm razão, vez que sem isso não haveria ciência. Basta abrir os olhos para ver que as conquistas industriais, enriquecendo a tantos 'homens práticos', não existiriam se tais homens não fossem precedidos por 'loucos' desinteressados, a morrerem pobres, sem nunca pensarem nessa 'utilidade', e sim movidos apenas pelo capricho. São esses 'loucos' os responsáveis pelo progresso a gerar lucros àqueles outros, os 'práticos'. Esses 'loucos' poupam aos outros o trabalho de pensar. Logo, a maioria não gosta mesmo de pensar, guiados só pelo instinto. Contudo, o instinto é rotina; e se o pensamento não o fecundasse, não progrediria mais no ser humano que na abelha ou na formiga.
Pelo progresso, é preciso então pensar por aqueles que não o querem; e como são numerosos, é necessário que cada um desses pensamentos seja o mais últil possível. De tudo, resta-nos um ensinamento: as obras mais interessantes são as que podem servir várias vezes, as que têm possibilidade de renovar-se.(Marcus Moreira Machado)
Nenhum comentário:
Postar um comentário