O impulso para a dominação nasce do medo da perda do próprio 'eu', temor que se revela nas situações onde o indivíduo se vê ameaçado diante do desconhecido. Nesse sentido, têm uma só origem o mito e a ciência, pois ambos querem subjugar as forças ignoradas da natureza, buscando a multiplicidade sem controle do sensível. O mito, para tanto, tem um procedimento que lhe é exclusivo. A exemplo, o sacerdote da tribo repete gestos e atitudes de cólera ou de pacificação co-relacionadas às potências naturais. Com efeito, através da mitificação, preservava-se um 'diálogo' entre os homens e a natureza, permitindo-se àqueles o medo face às desconhecidas manifestações desta última.
A ciência, todavia, transformou a natureza em juízo analítico, formalizando-a pela obrigação de se comunicar na linguagem numérica. E no lugar do mito, a razão que 'explica' e controla os fenômenos naturais. A magia, o encantamento, foram suprimidos pela 'racionalidade' dominadora.
Ora, a pretensão do mito era captar a origem, atribuindo-se ao rito o papel de controle dessa origem. Contudo, enquanto o fundamento mítico reside na imitação dos fenômenos da natureza, a ciência, por entendê-lo 'irracional', substitui essa repetição gestual pelo princípio da identidade. Por este princípio, somente o que é idêntico na natureza é o que deve ser conhecido. Daí, o entendimento de que o sujeito dotado de luz natural é o indivíduo que intelectualmente domina o mundo.
A razão é alterada, enfim, na própria constituição do sujeito, para quem, a fim de controlar os demais, deverá primeiramente saber comandar a si próprio, assim estabelecendo o processo de dominação.(Marcus Moreira Machado)
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