Invisível e essencialmente indefinível, eis o poder.
O poder é metafísico. Perceptível apenas indiretamente, através de suas consequências. Porque, diretamente, só é observado por meio de alusões, em virtude dos seus símbolos e de seus mantenedores (quer sejam pessoas físicas, quer sejam organismos institucionais); enquanto objeto ou ritos e procedimentos que o personificam.
Na sua habitualidade e especificidade mais característica, o poder é reduzível a uma relação, ou um conjunto de relações. Isso a ele confere, porém, caráter de absoluta relatividade, sendo desprovido de uma justificativa homogênea e integral.
É arbitrário pretender emprestar ao poder suporte de um fundamento além do seu efetivo exercício. Arbitrariedade tão própria às zeladorias do poder, quais sejam, as ideologias e doutrinas políticas. Tal espécie de consideração, desde a antiguidade clássica, se confunde com a questão tradicional acerca da essência do poder, construindo-se uma metafísica política.
A questão pode ser abordada de um outro ângulo, pela expressão desse poder, traduzida, sempre e em todos os lugares, com a obediência civil.
Emanada do poder, a ordem conquista obediência dos membros da comunidade. Essa subordinação deveria causar estranheza aos homens aptos ao raciocínio. Afinal, qual fenômeno singular este, onde a grande maioria obedece a minoria? A E por que a menor parcela obedece?
Origina-se de sentimentos muitos diversos a obediência; todos procurando no poder apoios múltiplos. Assim, constata-se, já no nascimento da vida social, estamos diante do poder, da mesma maneira que a criança encontra um pai logo que vem ao mundo.
O poder, com efeito, é visto como fato natural. Ele rege as vidas humanas há tanto tempo quanto existe a história da memória coletiva. O conceito de 'poder' tem início no mesmo entendimento de 'submissão como substância'. Por isso, não há 'poder' sem 'obediência': a obediência individualizada lhe dá forma. Por seu turno, este conteúdo sujeita à disciplina a vontade dos obedientes. A causa primeira da obediência é o hábito, o costume. Todavia, estes não são suficientes para explicá-la, quando, além, o poder não é mantido nos limites que lhe são habituais.
No objetivo de ocorrer expressivo acréscimo à obediência, imprime-se então um desenvolvimento de causa, limitando o amplo discernimento desse fenômeno.
Por essa razão, o pensamento segue duas direções, correspondentes às categorias do nosso raciocínio.
Busca-se fortalecer teoricamente a 'obediência'. Na prática, baseando-se em duas causas: uma 'causa eficiente' e uma 'causa final'. Declara-se: o poder "deve" ser obedecido "porque" ou "para que".
Nota-se, por efeito, no âmbito da relação causal desenvolveram-se os dogmas da 'soberania'.
O princípio eficiente da obediência é localizado em um 'direito' cujo detentor é o poder, gerado numa 'soberania' que o possui e nele se transforma, ao mesmo tempo representando-o. É dele esse 'direito' sob a condição indispensável de sua 'legitimidade', quer dizer, calcado na razão de sua origem.
Não obedecer é desacatar essa legitimidade. Desacato necessário a fim de se evitar a legalidade real da ilusória legitimidade.
(Caos Markus)
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