Que a recessão e o desemprego são um fenômeno mundial todos sabemos. Que as conseqüências desse fenômeno repercutem em forma de formidável catástrofe social nos países já debilitados por gigantesca inflação, como é o nosso caso, muito mais que saber, certamente nós brasileiros amargamente experimentamos em nosso cotidiano.
Soluções que em nada contribuem para extirpar da economia nacional o veneno que corrói o nosso poder aquisitivo, essas nos são apresentadas de quando em quando, ou melhor, de eleição em eleição. Contudo, se nada e nem ninguém consegue a medida eficaz, é porque não existe nenhuma disposição para tal, quer dizer, não se pretende mexer em estruturas já sedimentadas na política econômica do país, sempre vítima de deformações no tocante à geração e distribuição das suas riquezas.
Obviamente, os reflexos dessa distorção se fazem sentir sempre que se considere não ser a distribuição de renda um fato posterior à produção de riquezas, em que "a organização do próprio processo produtivo determina a forma como a riqueza produzida se distribui entre salários e lucros". O que, então, se verifica é a desarmonia entre capital e trabalho, naquilo que é considerado "excedente da produção".
É inegável que o crescimento da economia - em qualquer país - pode dar origem à maior distribuição ou maior concentração da renda, segundo o padrão de acumulação existente. E se, imparcialmente, identificamos o padrão adotado na economia brasileira, imediatamente constatamos que as fortes desvalorizações monetárias, sucessivas, teoricamente destinadas a devolver o valor real à moeda e a estimular as exportações, na realidade só estimulam a concentração interna de capitais e propiciam a absorção das empresas nacionais por parte dos que chegam de fora.
Mão-de-obra excepcionalmente bem qualificada, predomina a não participação do trabalhador no processo fabril, impossibilidade conseqüente do seu mau desempenho já adquirido em sua básica formação profissional. Essa ausência de atributos, uma constância jamais contestada por sindicato algum, acarreta a "dispersão salarial ao nível da classe trabalhadora" que, por sua vez, "não contraria o processo de concentração da renda, que se nutre da expansão excedente". As lideranças sindicais, insensíveis, protestam, dessa forma, sempre a conseqüência, nunca a causa, pois o que deveria estar em discussão é a qualidade de vida dos funcionários, uma decorrência imediata do seu melhor ou pior desempenho, a ocasionar maiores ou menores salários, sempre como desdobramento de sua maior ou menor intervenção naquele processo de concentração da renda, a possibilitar, então, a maior ou a menor grandeza salarial.
O dilema entre o capital e o trabalho em nações de economia frágil como é a nossa tem causa naquilo que Paulo Freire chamou de "migração do capital" para os países subdesenvolvidos, onde encontra condições excepcionais de valorização. Assim, observa Freire, a cada período mais ou menos longo de estagnação e de crise o capital se lança ao assalto de novas áreas fracamente ou não de todo integradas à sua esfera de dominação; isto lhe assegura um novo período de expansão e de euforia que se opõe à tendência anterior. Isso é o que, de resto, se verifica em toda a América Latina, onde o sistema produz muito menos do que necessita consumir, resultando a inflação desta "impotência estrutural". Não temos, de fato, excedente de produção, temos sim é um absurdo baixo consumo interno. Aquele almejado equilíbrio na balança comercial, ocasião em que promove-se a harmonia entre importação e exportação, é entre nós de todo desconhecido, porque aqui os tentáculos de um Estado burocrático e todo-poderoso subtraem à nação o seu direito à sanidade.
Como não temos estadistas e sim "corretores" nacionais, no Brasil não se confere a devida atenção ao conceito do celebrado economista John K. Galbraith: "A vida econômica e política é a matriz na qual cada parte está interligada às demais e todas se movimentam em conjunto". Se não temos quem efetivamente represente os intersses e reclamos do consumidor mais simples é porque "na moderna comunidade industrial, a voz dos ricos, que inclui, notadamente, a voz das diretorias empresariais, sendo tão bem falante, via de regra é ouvida como representando a voz das massas".Desbancar os oligopólios é desbancar o próprio governo, pois que a grande empresa tem um poder mais subjetivo, no entanto mais importante, justamente pela pressão que exerce nos governos de uma forma geral. "Advogados-estadistas" garantem, através de "lobbys" o atendimento dos interesses empresariais. O mesmo não se dá com o que se julgou denominar "classe trabalhadora", desprovida da necessária articulação política para o confronto nesse "cabo de guerra" em que se tornou a política econômica brasileira. Ao contrário disso, a sua representação se faz por meio de pessoas despreparadas para negociações, oriundas, muitas vezes, do mesmíssimo sindicalismo incipiente e anão, mais colaboracionista e sempre menos atuante.(Marcus Moreira Machado)
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