Quando Henry Ford pretendeu competir no mercado da produção de borracha natural, instalando em muitos hectares de terra do Norte brasileiro uma formidável "cidade" pré-montada, não soube sequer compreender os reclamos locais como verdadeiros fundamentos do conceito de 'valor'. Ao querer introduzir concepções supostamente civilizadas de moradia, habitação, Ford não 'valorizou' a típica rede de dormir dos caboclos, ignorou o jabá, o charque, como iguarias nativas. Houve revolta. O progressista empresário quedou-se em perplexidade, exclamando ser impossível para ele conceber a idéia de um povo que, embora servido de alimentos proteicos e vitaminados dos EUA; não obstante recebendo por moradias edificações de excelente padrão para os norte-americanos; ainda assim se rebelasse, não levando em conta até mesmo os altos salários -considerando a referência local- que lhe foi pago pelo pioneiro empreendedor.
Precursor da organização científica do trabalho, inovador, com a implantação de esteiras para a produção em série, homem que abominava a filantropia e enaltecia as vantagens de bem remunerar a mão-de-obra, Henry Ford não soube, porém, identificar e distinguir as 'riquezas' do lugar; para ele, estrangeiro, sem valor, mas de infinito valor (porque prazeirosas) aos nortistas do Brasil.
Nota-se, pelo exemplo, que um conceito objetivo e realista de 'utilidade' é o que, fundamentado nas intrínsecas qualidades de uma coisa, determina o seu valor de uso. E essa qualificação há que ser considerada na relação de conveniência entre a coisa e a satisfação que ela proporciona. A Psicologia, nesse caso, trará recursos à Economia, questionando o ser humano antes de ele ser tratado como consumidor padronizado.
Trazer bem-estar à população de um país será respeitar as suas crenças e os seus hábitos; admitir a correlação entre 'identidade' e 'utilidade'; aceitar o raciocínio de que um DVD player é tão importante quanto um pequeno rádio à pilha 'utilizado' pelo torcedor nos estádios de futebol. Será permitir a convivência entre 'sabedoria' e 'conhecimento'; coexistir o erudito e o popular -no reconhecimento da alma humana concebida como 'unidade', no dizer de Kant.
Preocupar-se com o bom desenvolvimento de um povo exige o não aniquilamento da sua personalidade, preservando-se a harmonia do 'compromisso' entre o primitivo instinto com o consciente adquirido por influência das forças sociais.(Marcus Moreira Machado)
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