"Genocídio" -um neologismo-, segundo os dicionaristas, é a recusa do direito de existência a grupos humanos inteiros, pela exterminação de seus indivíduos, desintegração de suas instituições políticas, sociais, culturais, linguísticas e de seus sentimentos nacionais e religiosos. O vocábulo certamen...te advém de “geno”, a exprimir, por sua vez, a idéia de sexo ou geração. Daí o adjetivo “genesíaco”, relativo a geração. Outros tantos léxicos apontam como sinônimo do substantivo feminino “chacina” o figurativo “matança”, observando que o ato de “chacinar” compreende, antes, dispor carne de porco em postas, uma vez que “chacim” é designação antiga desse suíno. Cientes da origem do mundo e do homem, convictos de que o ser humano não principiou a sua existência sob a rude e primária forma de um porco, colocamos em dúvida a veracidade dos extermínios ora verificados pelo país afora, enquanto expressões de reais chacinas. Nem mesmo em sentido figurado. O que se nos parece é figurar nesses movimento assoladores a mais completa ruína, só verificada na mais pura tradução dos genocídios. Pois, não está o Brasil mergulhado na desintegração de suas instituições, quer sejam elas políticas, sociais, culturais? É Guerra Junqueiro, em “O Regimen”, quem adverte: “A ruína bruta é o de menos. Uma parede no chão, levanta-se; um banco sem dinheiro, atulha-se de dinheiro, facilmente. Mas, a ruína moral (...)! A morte de milhões de almas, milhões de idéias, de consciências(...)! É pavoroso!”. Responsabilizar a economia como causa, a motivar a violência institucionalizada, é faltar com a mais elementar verdade. O estado de indigência (moral, antes de qualquer outra) em que nos encontramos é, sim, consequência de um outro aviltamento: o de uma sociedade abjeta, desonrada por um regime corrupto. A filantropia deu lugar à misantropia.Ora, a aversão aos homens e à convivência social é mais comum num Estado de exceções...! Neste momento, também não demais relembrar Bertold Brecht: “(... ) Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado, o assaltante, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, o corrupto (...)”. Resta-nos, pois, identificar quem é o “imbecil” na política brasileira, a permitir que a filosofia do Estado nacional seja a filosofia do porco. Ou, se já identificado, é nossa a tarefa de eliminar o “imperativo da besta, a ditadura do mal, a converter a religião em sacrilégio, o direito em crime, a verdade em burla, a força em tirania”. Ou entendemos por disciplina a instrução e a educação (básicos pressupostos para o governo de entidades coletivas, fundado no binômio 'trabalho e coordenação'), ou aceitamos nossa rendição à norma como instrumento de flagelação, em penitência que não devemos, por castigo que não merecemos. Admitir-nos submissos à linguagem sibilina de poderes insensatos é proclamar a nossa própria parvoíce. Não somos um bando nômade a errar ociosamente. E, portanto, não será por “bruxos” e seus infames vaticínios que deveremos nos deixar dirigir. Buscar a justa proporção, ou a exata combinação de forças, num estado dos Poderes Públicos que se co-relacionem, é preocupação de todos os que desejamos consolidado equilíbrio social. Porque nossos destinos não aguardam outra coisa, como bem o disse Lauro Porto Machado: “A plebe que sofre e a ostensiva realeza /Tudo tem o seu fim, tem seu objeto:/ Harmonia e equilíbrio da natureza”. E é essa intrínseca natureza que nos torna seres humanos, e não porcos. E esta superior qualidade nos motivará à indignação, sempre que se pretenda decretar a "gênese do apocalipse", ou o "genocídio" do povo brasileiro, mesmo travestido em múltiplos "extermínios", especialmente o da consciência naciona. E haverá de ser tamanha esta revolta, que nenhum regime poderá declarar-se bom, justo e forte quando pretender a mortificação “pela fome ou pelo exílio, pelo cárcere ou pela calúnia”. Porque, desacreditando-o, estaremos nos redimindo pela nossa auto-determinação.
(Caos Markus)
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