A negação da nossa humanidade como exclusivo atributo a cada homem na face da terra tem-se operado através da transposição dos valores positivos alcançados em séculos marcados pelas guerras e pela mais franca injustiça social, em desprezo á luta pela civilização, substituindo-a pela barbárie originária, num paradoxo entre evolução e progresso. No entanto, é justamente em nome do aprimoramento que a megalomania se instala, na procura de uma tão vaga quanto inútil perfeição do homem, pretensamente elevado à condição de criador. Enquanto a tecnologia assume patamares jamais imaginados, conferindo à raça humana uma duvidosa característica situada entre a genialidade e a supremacia, perde o homem, de forma abrupta e cruel, a sua própria "alma", em espetacular derrocada do aperfeiçoamento moral que paulatinamente vinha sedimentando como atributo distintivo da sua real singularidade; maravilhado com as múltiplas possibilidades de transformação da natureza a partir da sua intervenção, não atenta, porém, para o perigoso distanciamento entre o progresso da técnica e o retardamento do espírito, já escravo de si mesmo, ignorante e imperdoavelmente alheiro à instalação do mais insidioso descalabromoral. Sistemas e formas de governo que não considerem a distribuição das efetivas melhorias, conseqüentes da investigação científica sistematizada, correrão, independentemente de cor partidária por cunho ideológico, risco crescente de morte prematura, corroídos na fragilidade de estruturas não comprometidas com a fraternidade universal como projeto pioneiro de vida concreta. Alimentar a revolta é duvidar da insanidade como efeito imediato da segregação; e se há hoje algo a temer, sem dúvida pouco se compara ao impérvido social fundamentado na restrição à grande maioria, impedida de compartilhar das benesses para as quais contribuiu confinada agora ao submundo da demência típica dos excluídos. Mudar de opinião, reavaliando teses antes formuladas na exacerbação e na arrogância será perseguir uma sabedoria que, muito embora além de nós mesmos, é seguramente mel melhor modelo de sociedade, porque respaldado nos limites de quem, eterno aprendiz, enxerga na prudência o caminho mais seguro a ser percorrido, afastando-se prematuridade deveras inconciliável com progresso humano. (Marcus Moreira Machado)
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