Não sou exatamente um pessimista. Ao contrário, não apenas o real como também o hiper real me fascinam; mas não é minha a culpa se a realidade é péssima. Não pretenderei, pois, otimizar situações onde se registra a mais evidente degeneração do ser humano. E não é outra coisa o que identificamos num povo como o do Brasil, tragado pela superfluidade no tratamento de seus peculiares problemas nacionais.
De fato, rendidos estamos. Não temos mais que uma cultura de “almanaque”, consagrando o banal, ritualizando fórmulas decadentes de salvação individual ou coletiva. Somos tão descartáveis quanto as informações que consumimos todos os dias.
Valorizar a cultura seria, no mínimo, medida profilática, a prevenir males cruciais como a fome, a miséria, atualmente combatidos quixotescamente como causa da violência, origem da desagregação social, quando não são mais que reflexos de caos anterior.
Quando se trabalha com fenômenos sociais não se pode esperar a precisão da informática ou a certeza dos laboratórios; em sociedades múltiplos aspectos concorrem para maior possibilidade de dúvidas do que para probabilidade de acertos; o organismo social, quando doente, requer mais do que boa vontade, mais que otimismo, carece de conhecimento, e conhecimento prático. O que se verifica em ciências políticas e econômicas no Brasil é justamente o distanciamento da realidade mais óbvia. Opiniões diversas são apresentadas como “sui gêneris”, impressionando pelo ineditismo, mas todas por demais fantásticas para poderem ser pragmáticas. Talvez, por que não, não se queira mesmo resolver coisa alguma. Então, buscar alternativas, sempre, seja forma de ocultar a premeditação no desinteresse político; pois quem não pode ou não consegue crer na hipótese do “lucro” garantido pela miséria alheia?
No labirinto das teorias governamentais estamos a esperar um corajoso e apaixonado Teseu, a desafiar o Minotauro pelo amor à Ariádne. E como quem não tem nada briga por pouco, a violência fermenta a convulsão social em barbárie coletiva, por ninharias, por quinquilharias que em nações civilizadas não passam de lixo.
Estamos também virando lixo! E o que é pior: não degradável. Vermes vorazes, encontramos na podridão da cultura brasileira, amesquinhada e aviltada, o putrefato alimento de nossas sórdidas paixões. Alguns já marginais, outros ainda marginalizados, em breve seremos todos párias; reduzidos a ínfima casta, excluídos da sociedade, devoraremos uns aos outros em antropofagia de “guerreiros” modernos.
1984 já passou. Orwell talvez não soubesse que na Revolução dos Bichos os brasileiros não seriam metáforas, mas os próprios bichos.
O esforço de alguns (não poucos!) homens para derrubar outros e subir pelos seus cadáveres traduz a profunda angústia por que passamos, mergulhados no canibalismo e nos atos selvagens da modernidade social, matando e sendo mortos, odiando e sendo odiados, subjugados, enfim, à lei não escrita, porém impiedosa da sobrevivência.Se ao menos acreditassem os nossos dirigentes no ciclo-reflexo de causa e efeito, poderiam os homens de governo renunciar à trama de atividades direcionadas a garantir privilégios de grande farsa, consagrando, então, todo o seu tempo e energia exclusivamente na reabilitação do país. (Marcus Moreira Machado)
Nenhum comentário:
Postar um comentário