Páginas

sábado, 1 de setembro de 2007

(02/09/07) MEIO-A-MEIO

Cada um é metade.
Não uma metade 'assim' e outra que não se sabe.
A gente pode até ser meio isso e meio aquilo.
Ainda assim, tudo em uma só metade.
Porque se fossemos de fato constantes em coerência, distantes de contradições...
Se acordássemos como nos deitamos para dormir -mantendo a bondade primacial ou conservando a crueldade original (uma coisa ou outra, não coisa e outra)...
Só então seríamos um inteiro, íntegros, e não duas metades ora alternadas, às vezes circunstancialmente mescladas.
E por reduzidos que somos, é essa a nossa inteira parte: a metade de cada um.
Nessa metade, o meio multiplica-se em quantos necessários; seja para firmar crença de que colaboramos sinceramente com o crescimento de um nosso semelhante; seja para reduzir ainda mais aquele que a nós já é pequeno o suficiente deixando-nos de incomodar.
Verdade, sim, é que temos por companhia a ausência da outra metade que imaginamos possuir -aquela na qual pretendemos ser o lado bom, quando esta outra é banda ruim.
Porque cada um é protagonista de seu peculiar enredo. E a todos , a mera sugestão de que a história é única, versão ímpar.
Nem eu nem você, nenhum de nós quer ao menos se convencer do muito que somos todos, quando a simples existência dos demais deixa de ser mera figuração.
Marcus Moreira Machado

sexta-feira, 31 de agosto de 2007

A "REVOLUÇÃO" DO PSICOPATA

Sendo o psicopata essencialmente um desaptado à vida social, possui já um fator predisponente para "sentir", mais do que o resto dos mortais, a 'Revolução'.
Insensivelmente, ele procura os extremos como linha de sua conduta na sociedade e, por isso, pode incorporar-se com maior facilidade às organizações revolucionárias ou contra-revolucionárias.
O psicopata com tendências reprimidas, particularmente, sente-se em tais momentos impelidos à atuação particular. Com ela, de um lado, satisfaz seus desejos exibicionistas; e de outro, descarrega seu potencial sádico-masoquista.
Tanto em organizações fascistas como nas marxistas e anarquistas -ou seja, nos grupos que postulam os métodos de ação como remédio à crise social- destaca-se com particular frequência este tipo ressentido. Desde logo, ele pode ser confundido com o verdadeiro revolucionário, vez que esse último requer para isto a prévia saturação do seu impulso; enquanto aquele outro, ao contrário, propende a buscar por todos os meios uma compensação à sua falta de satisfação erótica propriamente dita.
Enfim, são indivíduos que menos se enquadram no marco de uma realização ideológica, do que -de fato- almejam a oportunidade de atender parcialmente à satisfação de sua libido.

quinta-feira, 30 de agosto de 2007

ATITUDE OU OPINIÃO

Por 'atitude' se entende algo mais permanente, a predisposição do indivíduo para o desenvolvimento de alguma maneira de agir.
'Opinião' é somente a manifestação da crença, da ideologia do indivíduo.
Nesta compreensão, ao responder como você avalia a administração do presidente da República (se ótima, boa, regular, ruim, péssima), você está manifestando a sua opinião, apenas, sobre o tema da abordagem.
Na atitude, contudo, muito além do que você crê e até defende, o interesse é o da sua ação concreta.
Na atitude, não somente avaliamos, porém, intervimos na situação.
Já é o suficiente para percebermos que 'opinadores' muitos somos.
Atitude... Esta quase ninguém possui.
Afinal, na 'opinião', você é mero receptor do que lhe passaram como certo ou errado, como o mal e o bem. Mas na 'atitude' você é o próprio agente, aquele que não faz propaganda de suas idéias e, ao contrário, põe essa idéias em prática.
Qual é a sua ?
Marcus Moreira Machado

TRUÃO

Truão demissionário, sou emissário do rei; faço rir o hipócrita, rirá também o idiota. Se tenho imunidade, ela é filha da maldade da corja que me sustenta. O bobo da corte não é por motivo torpe que faz sua ladainha. Sua tarefa é eximir da culpa o adultério da rainha, o desfalque do tesoureiro, os crimes de todo o reino. A graça deste palhaço vive hoje no asco que habita todo o palácio. Enquanto riem do chistoso anão, há agora uma grande multidão. Alheia, não mais percebe a coroa que o cetro ainda é majestade, mas fora é forte a tempestade. Da revolta, no medo, um grito soa. É clamor, o brado ecoa: "-Liberdade!!" Marcus Moreira Machado

quarta-feira, 29 de agosto de 2007

ITINERÁRIO

Romperemos o mundo,
encontrando o rumo da verdade
hoje transportada
na viagem itinerante do olvidado.
Priscas datas,
em concerto na remota memória,
forçam-nos ao extracontemporâneo:
nem vanguarda
nem o inusitado.
Apenas -e isto mais que tudo-
o oculto
a sete chaves
da mente civil,
pela atroz mentalidade espartana
que induz à devassidão
da brusca e contínua
queda de toda uma civilização.
Somos deveras comportados:
matamos, odiamos e
pensamos desejar
(a moda neste tenebroso 'inverno');
hibernamos todos os sonhos
lindos e loucos,
na sonolenta trajetória do vaivém.
Desdém ao presente do indicativo:
o nome da festa que dá direito
ao paraíso da promiscuidade mais sã,
porque da auto e livre ilusão.
'Dresden', do tenente imperativo:
a fome na testa
que dói no peito
o castigo da ambiguidade titã!
Ou, será, a nossa própria decisão!?
Marcus Moreira Machado

terça-feira, 28 de agosto de 2007

AS LÁGRIMAS DO MUNDO

Os bebês não têm qualquer noção de etiqueta ou decoro.
Os bebês não têm respeito algum por normas sociais ou compostura.
Eles não fazem qualquer esforço para censurar seus pensamentos.
Os bebês simplesmente abrem a boca e expressam em alto e bom som o quê se passa em sua mente: choram o quanto podem !!
O choro das crianças comprova a indômita presença da escuridão em nosso mundo.E pode servir para nos lembrar de que deixamos de chorar por isso.
Numa sociedade reprimida. os bebês exercem o importante papel de expressar francamente as emoções de todos.
Enquanto o resto das pessoas enterra estoicamente seus sentimentos mais ruidosos em caixas de concreto, OS BEBÊS CHORAM AS LÁGRIMAS DO MUNDO INTEIRO.
Quando Josué e os israelitas tomaram a cidade de Jericó, sua principal arma foi o barulho; o povo marchando ao redor da cidade, durante uma semana, conduzido por 7 sacerdotes tocando trombetas.
No sétimo dia, silenciadas as trombetas, o povo soltou um forte brado, e os muros da cidada ruíram.
É, assim, de se imaginar: o choro das crianças -dia após dia, noite após noite- é uma poderosa arma para destruir aquela "cidade pagã" cercada de "muros altos", que chamamos de idade adulta.
Com o passar do tempo, não nos resta outra coisa a fazer senão nos juntar às crianças, isto é, voltarmos à nossa própria infância, e lá RESGATAR OS GRITOS DAQUELE PEQUENO QUE VIVE DENTRO DE NÓS.

segunda-feira, 27 de agosto de 2007

COLÓQUIO DOS DISSIDENTES

Nem bem chegam à reunião os cinco amigos, e um deles, Darwin, conjectura: "-Neste mundo está sempre se processando a multiplicação ilimitada de criaturas vivas. Todavia, alimento e espaço habitável útil são limitados. O resultado: uma competição de vida ou morte entre todos os seres vivos, em eterna luta pela existência, pela qual vivem os que melhor se adaptam ao ambiente, condenados os outros à morte. Mas também o ambiente vai se modificando ao longo do tempo. O quê exige a modificação, igualmente, das criaturas viventes, isto é, esses seres evoluem, umas espécies das outras, para a sobrevivência às novas condições".
Ao que responde-lhe Marx: "- Mas há nessa evolução estreita correlação entre um movimento de idéias do ser humano e a realidade material da sua sociedade. E tal movimento é também produto de modificações, as que ocorrem na base material da sociedade, porque o movimento do pensamento não passa de um reflexo do real, já que é produto do cérebro humano, e este, por sua vez, um produto também da natureza."
Intervem Hegel, um tanto indignado com o quê se lhe afigura inaceitável -a observação de Marx-, tamanha apologia a visão estritamente materialista: "-Ora, é absurdo reduzir o pensamento a tal ponto. Afinal, é a idéia, o pensamento,o verdadeiro criador da realidade. E nela, o espiritual, o absoluto, são forças que, movendo-se por si mesmas, movimentam todo o universo".
Ouve-se um brado: "-Discordo!! -clama Merleau-Ponty- A minha existência é quem dirige e sustenta esse meio, pois sou eu quem faço ser para mim esta tradição que decidi retomar, ou este horizonte cuja distância de mim desabaria, pois que só pode me pertencer seu eu estiver lá para percorrê-la com o olhar. Eu não sou um momento do mundo! Não sejam hipócritas! É através da minha percepção, da minha consciência, que o mundo se dispõe à minha volta e então começa a existir para mim".
Jung, até então calado, mas muito atento ao embate, arremata a conversa: "- Perdoem-me a intromissão, mas eu acho que vocês todos possuem tantos recalques que nem percebem a imensa vontade de viver, presente em cada um de nós, e que se mostra facilmente em nossa libido.Isso é mais simples que instinto sexual. É viver, e não sobreviver!".
Calaram-se, todos.
Marcus Moreira Machado

domingo, 26 de agosto de 2007

MARUJO

Há um barco temerário.
Ele singra um rio temeroso.
Eu, nesse barco, lavo o convés;
e sei do medo o quê me contam os marujos.
Nesse rio, a vida tem mais de vinte séculos;
e sei dela o quê me contam os pássaros.
Náufrago, não sobrevivo em terra
-sei dela um pesadelo que tive:
quando as águas, de tão mansas,
imitaram ancoradouro.
Nesse sonho, eu tinha grilhetas nos pés,
e cravaram-me na areia, feito âncora.
(Marcus Moreira Machado)