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segunda-feira, 22 de novembro de 2010

SÁBADO, 1 DE JANEIRO DE 2011: "MURALHA"

Ao som de um bolero vienense, valsavam todos um maxixe na corte do rei na barriga. No frenesi, ninguém suspeitava que a seca já não era mais nordestina, castigando agora toda a democracia racial irmanada no projeto de redenção do ser desumano. E chovia tanto lá fora, mas chovia tanto, a ponto de não perceberem que os tempos eram outros, não mais os bons tempos da felicidade geral da nação; se dançavam conforme a música, bailavam sem melodia, pois a orquestra cochilava, exausta de repetir economicamente as mesma seleções. Eis que a voz do Brasil emudece. Geléia geral. Afinal, por que silenciara o brado? E o bardo, por que não trovava as canções à formosura feminina das tropas entrincheiradas no golfo da baía da Guanabara? Estácio de Sá e São Sebastião bem que serviram de exemplo aos incautos sobre o pouco ou nenhum valor das flechas de cupido. Somente um motim explicaria aquelas naus à deriva, sem socorro algum, perdidas no triângulo de vértice apontado para baía dos porcos latinos! Desesperadamente, ao alerta estrondoso acorreu a multidão para o abrigo anti-eleição evitando ser torpedeada pelos napalms de gases paralisantes. Os sobreviventes, lembrando Orwell, revolucionaram em perfeita coalizão com um admirável mundo novo, todo cheio de expectativas, prometedor e cumpridor dos básicos direitos dos sem vale-refeição. Como explicar o surto de febre verde-amarela contagiando de progresso a desordem na plantação de bananas da república? Obra de acaso? Não. Definitivamente, não. Não se permitiam interpretações doutrinárias, ainda que alicerçadas em decisões jurisprudenciais; o retrocesso seria expurgado a todo custo, exilado aos confins da reduzida mata atlântica, sem direito a verde, sem passagem na ponte aérea dos zepelins e dos "gatos" de TV fechada e da Net. A própria lei da gravidade, bem como a sua irmã siamesa, a da oferta e procura, foram abolidas, para coibir os que levitavam na demanda. Aquela enfermidade, certamente, aparentava ser um resquício de miliciana ditadura, ou melhor, de todas as ditaduras adormecidas no extinto vulcão da cordilheira do planalto do centro-oeste, leste-sul do Trópico por onde morreram na praia tantos projetos faraônicos, inclusive o da muralha separando o gueto favelado da cidadania urbanizada. Ao longe alguém cantarolava despreocupadamente uma nova cantiga de ninar, inspirada, talvez, nos cânticos gregorianos, dos mais modernos papas da mídia eletrônica. Anunciava-se a vinda celestial das ondas sonoras captadas nas antenas de retransmissão dos mais íntimos impulsos passionais, avizinhava-se a salvação pelo sagrado direito à mediação de todo homem livre. Dito e feito. Nunca mais os trocadilhos seriam a máxima expressão da realidade nacional. Afinal...!
(Caos Markus)

SEXTA-FEIRA, 31 DE DEZEMBRO DE 2010: "HESITAÇÃO"

Sócrates...
Ele e Jesus prefaciaram os sofistas, no posfácio dos cínicos.Em comum, muita retórica a servir de nota de rodapé para Platão, Lucas, João...os evangelistas todos.Alguma semelhança com a preguiça de outros INcomodados, a exemplo de "To be or not to be, that is the...". A questão é que lideram. E o fazem porque hesitam, e de tal maneira que, superando qualquer antinomínia, aproximam inércia e movimento, induzindo, na eloquência de reflexão, o gesto sem ação.
(Caos Markus)

QUINTA-FEIRA, 30 DE DEZEMBRO DE 2010: "PROLE PLEBE"

Filhos da mãe, gentil Portugal Brasa infernal, vermelha tinta do pau que mata a cobra... E... nada sobra Espanha moura no meu quintal, arriba ao interior, afinal. Sou jaçanã, um bastardo do Tio Sam. Mas se ergue a clava o teu braço ao norte... É dependência, é morte! Pois, és tu a mil num sonho vívido, raio que aparta em duas a prole plebe do Brasil nesta terra firme deste estado-Esparta. Já podeis a Pátria, de repente, ver ordem unida, jamais será vencida. Mãe gentil, abre as asas sobre nós, iberdade, liberdade, deitada eternamente.
(Caos Markus)

QUARTA-FEIRA, 29 DE DEZEMBRO DE 2010: "SHOPPING CENTER"

Uma grande fonte do poder das empresas transnacionais nos países de frágeis economias é o controle da ideologia, ou, por equivalência, dos valores que condicionam a maneira como vive um povo. Nesses casos, a propaganda governamental não se iguala ao poder da publicidade. São dos conglomerados empresariai...s a decisão do que será assistido na televisão e nos cinemas, qual a programação no rádio, o conteúdo dos jornais e revistas; e, generalizadamente, de tudo o que é oferecido nos meios mediáticos, com destaque à internet. Para a imensa maioria da população, o contato com a escola é passageiro, porém, perdura por toda a sua vida a estreita proximidade com esse "mercado livre". Pela vastidão do subdesenvolvimento, as empresas -no contexto do processo da globalização- comercializam, como enorme sucesso, os mesmos sonhos que vendem ao mundo industrializado. Estimular o consumo em países de baixa renda e adaptar preferências locais a produtos distribuídos mundo afora, este é o propulsor de um crescente "Shopping Center" sem fronteiras. Em suas "lojas", a prioridade da política desenvolvimentista (destinada a atenuar os mais cruciantes problemas verificados na precariedade do ensino e na inconsistente cultura dos países consumidores) se resume a um artigo: a transferência de ideologia do mercado produtor, assegurando o lucro fácil gerado pela facilitada demanda. (Caos Markus)

TERÇA-FEIRA, 28 DE DEZEMBRO DE 2010: "BINÔMIO"

Ainda que fenômenos distintos, o poder e a violência constantemente aparecem juntos. Associados, o poder é fator principal e predominante. A usual identificação de violência e poder provém da consideração de que o governo se exerce como domínio, aparente ou dissimulado, do homem sobre o homem, através da violência explícita ou tácita. Todavia, o poder não se reduz à dominação nem à imposição da força, porque violência e poder não são fenômenos naturais, mas pertencem a outro domínio, ao dos assuntos políticos, cuja qualidade -essencialmente humana- é a garantia da faculdade de ação do homem, considerada a sua capacidade de iniciar um novo processo, abordando outros contextos. 'Agir' tem por genuína acepção o significado de 'trazer', 'criar', 'Agir' se traduz, portanto, em 'movimentar-se', em expressão de sua atividade por meio de contínuo exercício. Nesse sentido, o Estado não é um produto do pensamento mas sim da ação. Então, quando limitado à idealização, restrito à ideologia, esse mesmo Estado é violento. De igual maneira, qualquer revolução calcada taõ-somente no pensar contínuo, em desprezo à ação sistemática, não é revolução, é a inércia do homem no reducionismo da sua inócua prática, circunscrita à confirmação da violência no binômio opressor-oprimido. (Caos Markus)