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segunda-feira, 12 de outubro de 2009

SEGUNDA-FEIRA, 16 DE NOVEMBRO DE 2009:"AMPLITUDE E EXISTENCIALIDADE"

As doutrinas que aos direitos públicos subjetivos querem atribuir específicos fundamentos, para vinculá-los a determinada filosofia política ou ao modo de exercício do poder, quer dizer, condicioná-los ou ao liberalismo ou à democracia, deixam de observar o que deles são os maiores atributos, isto é, não verificam a sua preeminente amplitude e a sua perene existencialidade. Norteadas unicamente pela análise sociológica do fenômeno político, essas doutrinas não percebem os fatores universais que acompanham a própria evolução do Estado. Os ciclos de liberalismo e de despotismo são constatados historicamente, deles não descuidando a análise sociológica. Contudo, a rejeição às tendências totalitárias se estriba na natural vocação do homem para o ideal de liberdade, a repudiar, sempre, os regimes contrários a essa natureza. As doutrinas que intentaram justificá-los não dispensaram o princípio anterior ao próprio fato do poder, o qual àquele se vincula, ou seja, não puderam se separar da idéia de que o homem antecede o poder estatal, num direito que lhe é imanente, num Direito Natural.
(Marcus Moreira Machado)

DOMINGO, 15 DE NOVEMBRO DE 2009:"REGIMES: MONÓLOGO E DIÁLOGO"

Sendo a democracia regime político cujo ideal se prende a uma identificação entre as vontades dos governantes e governados e variada pela possibilidade de diálogo, este não se verificaria, obviamente, se fossem incontrastáveis os atos governamentais. Ao invés de eventual oposição às deliberações políticas, ver-se-ia submissão a elas, transformado então o diálogo em monólogo, peculiar, este, aos regimes autocráticos. Também o reconhecimento das limitações jurídicas do exercício do poder resultaria da índole e da natureza do Estado democrático, nascido ou não daquele mesmo enérgico sentimento, da opinião do povo.
(Marcus Moreira Machado)

SÁBADO, 14 DE NOVEMBRO DE 2009:"A ENERGIA DA OPINIÃO"

A atitude do Estado frente ao indivíduo alterou-se em seu cerne. Tornou-se social o indiferente Estado liberal, imbuído de uma determinada moralidade, a de manter a paz social; e, concomitantemente, viu-se contagiado por um sentimento de justiça, devendo assistência ao mais fraco, mas sem que isso viesse desorganizar as empresas da iniciativa privada, de modo a assegurar, também, a própria existência de trabalho. Na sua posição fiscalizadora, a serviço da concórdia, compulsoriamente, o Estado reduzia a um acordo de classes, nos termos da lei, a luta de classes apregoada por Karl Marx. Na racionalização da democracia, estampava-se um reforço da idéia de soberania popular. Para salientar o seu rompimento com o passado das monarquias, as Constituições desse período, como a indicar o Direito organizando tecnicamente o Estado, declararam que “Todos os poderes emanam do povo e em nome dele são exercidos”.Constata-se que as reformas, significando alteração sensível do Estado, dependem da opinião do povo, resultam do seu sufrágio plebiscitário, são conseqüência do seu enérgico sentimento.
(Marcus MoreiraMachado)

SEXTA-FEIRA, 13 DE NOVEMBRO DE 2009:"CARLOS"

Carlos Marighella nasceu em Salvador, Bahia, em 5 de dezembro de 1911. Era filho de imigrante italiano com uma negra descendente dos haussás, conhecidos pela combatividade nas sublevações contra a escravidão. De origem humilde, ainda adolescente despertou para as lutas sociais. Aos 18 anos iniciou curso de Engenharia na Escola Politécnica da Bahia e tornou-se militante do Partido Comunista, dedicando sua vida à causa dos trabalhadores, da independência nacional e do socialismo. Conheceu a prisão pela primeira vez em 1932, após escrever um poema contendo críticas ao interventor Juracy Magalhães. Libertado, prosseguiria na militância política, interrompendo os estudos universitários no 3o ano, em 1932, quando deslocou-se para o Rio de Janeiro. Em 1o de maio de 1936 Marighella foi novamente preso e enfrentou, durante 23 dias, as terríveis torturas da polícia de Filinto Müller. Permaneceu encarcerado por um ano e, quando solto pela “macedada” – nome da medida que libertou os presos políticos sem condenação -- deixou o exemplo de uma tenacidade impressionante. Transferindo-se para São Paulo, Marighella passou a agir em torno de dois eixos: a reorganização dos revolucionários comunistas, duramente atingidos pela repressão, e o combate ao terror imposto pela ditadura de Getúlio Vargas. Voltaria aos cárceres em 1939, sendo mais uma vez torturado de forma brutal na Delegacia de Ordem Política e Social (DOPS) de São Paulo, mas se negando a fornecer qualquer informação à polícia. Na CPI que investigaria os crimes do Estado Novo o médico Dr. Nilo Rodrigues deporia que, com referência a Marighella, nunca vira tamanha resistência a maus tratos nem tanta bravura. Recolhido aos presídios de Fernando de Noronha e Ilha Grande pelo seis anos seguintes, ele dirigiria sua energia revolucionária ao trabalho de educação cultural e política dos companheiros de cadeia. Anistiado em abril de 1945, participou do processo de redemocratização do país e da reorganização do Partido Comunista na legalidade. Deposto o ditador Vargas e convocadas eleições gerais, foi eleito deputado federal constituinte pelo estado da Bahia. Seria apontado como um dos mais aguerridos parlamentares de todas as bancadas, proferindo, em menos de dois anos, cerca de duzentos discursos em que tomou, invariavelmente, a defesa das aspirações operárias, denunciando as péssimas condições de vida do povo brasileiro e a crescente penetração imperialista no país. Com o mandato cassado pela repressão que o governo Dutra desencadeou contra o comunistas, Marighella foi obrigado a retornar à clandestinidade em 1948, condição em que permaneceria por mais de duas décadas, até seu assassinato. Nos anos 50, exercendo novamente a militância em São Paulo, tomaria parte ativa nas lutas populares do período, em defesa do monopólio estatal do petróleo e contra o envio de soldados brasileiros à Coréia e a desnacionalização da economia. Cada vez mais, Carlos Marighella voltaria suas reflexões em direção do problema agrário, redigindo, em 1958, o ensaio “Alguns aspectos da renda da terra no Brasil”, o primeiro de uma série de análises teórico-políticas que elaborou até 1969. Nesta fase visitaria a China Popular e a União Soviética, e anos depois, conheceria Cuba. Em suas viagens pôde examinar de perto as experiências revolucionárias vitoriosas daqueles países. Após o golpe militar de 1964, Marighella foi localizado por agentes do DOPS carioca em 9 de maio num cinema do bairro da Tijuca. Enfrentou os policiais que o cercavam com socos e gritos de “Abaixo a ditadura militar fascista” e “Viva a democracia”, recebendo um tiro a queima-roupa no peito. Descrevendo o episódio no livro “Por que resisti à prisão”, ele afirmaria: “Minha força vinha mesmo era da convicção política, da certeza (...) de que a liberdade não se defende senão resistindo”. Repetindo a postura de altivez das prisões anteriores, Marighella fez de sua defesa um ataque aos crimes e ao obscurantismo que imperava desde 1o de abril. Conseguiu, com isso, catalisar um movimento de solidariedade que forçou os militares a aceitar um habeas-corpus e sua libertação imediata. Desse momento em diante, intensificou o combate à ditadura utilizando todos os meios de luta na tentativa de impedir a consolidação de um regime ilegal e ilegítimo. Mas, mantendo o país sob terror policial, o governo sufocou os sindicatos e suspendeu as garantias constitucionais dos cidadãos, enquanto estrangulava o parlamento. Na ocasião, Carlos Marighella aprofundou as divergências com o Partido Comunista, criticando seu imobilismo. Em dezembro de 1966, em carta à Comissão Executiva do PCB, requereu seu desligamento da mesma, explicitando a disposição de lutar revolucionariamente junto às massas, em vez de ficar à espera das regras do jogo político e burocrático convencional que, segundo entendia, imperava na liderança. E quando já não havia outra solução, conforme suas próprias palavras, fundou a ALN – Ação Libertadora Nacional para, de armas em punho, enfrentar a ditadura. O endurecimento do regime militar, a partir do final de 1968, culminou numa repressão sem precedentes. Marighella passou a ser apontado como Inimigo Público Número Um, transformando-se em alvo de uma caçada que envolveu, a nível nacional, toda a estrutura da polícia política. Na noite de 4 de novembro de 1969 – há exatos 30 anos -- surpreendido por uma emboscada na alameda Casa Branca, na capital paulista, Carlos Marighella tombou varado pelas balas dos agentes do DOPS sob a chefia do delegado Sérgio Paranhos Fleury. Resumo biográfico1911 - No dia 5 de dezembro, Carlos Marighella nasce na Rua do Desterro número 9, na cidade de São Salvador, Estado da Bahia. Seus pais são o casal Maria Rita do Nascimento, negra e filha de escravos, e o imigrante italiano, o operário Augusto Marighella. Carlos teve sete irmãos e irmãs.1929 - Marighella começa a cursar engenharia civil na antiga Escola Politécnica da Bahia, depois de haver estudado no Ginásio da Bahia, hoje Colégio Central. Numa e noutra escola, destaca-se como aluno, pela alegria e criatividade. São famosas suas diversas provas em versos.1932 - Ingressa na Juventude Comunista. O Partido Comunista havia sido criado em 1922. Com a revolução de 30 uma grande efervescência política varria o Brasil. Marighella participa de manifestações contra o regime autoritário e o interventor Juracy Magalhães. Inconformado com versos de Marighella que o ridicularizavam, Juracy manda prendê-lo e espancá-lo.1936 - Abandona o curso de engenharia e vai para São Paulo a mando da direção, reorganizar o Partido Comunista, que havia sido gravemente reprimido após o levange de 1935. É, porém, novamente preso e torturado durante 23 dias pela Polícia Especial de Felinto Muller.1937 - Marighella é libertado pela anistia assinada pelo ministro Macedo Soares e, quatro meses depois, Getúlio dá o golpe e instaura o Estado Novo. Na clandestinidade, Marighella é encarregado da difícil tarefa de combater as tendências internas dissidentes da linha oficial do PCB em São Paulo.1939 - Preso pela terceira vez, é confinado em Fernando de Noronha. Na cadeia, os revolucionários presos organizam uma universidade popular e Marighella dá aulas de matemática e filosofia. 1942 - Os presos políticos vão para a Ilha Grande, no litoral do Rio de Janeiro, porque Fernando de Noronha passa a ser usada como base de apoio das operações militares dos aliados no Atlântico Sul.1943 - Na Conferência da Mantiqueira, Marighella, mesmo preso, é eleito para o Comitê Central. O Partido Comunista adota linha de apoio ao governo Vargas em razão da entrada do Brasil na guerra, posição de que ele discorda, embora a cumpra, por dever de militância.1945 - Anistia, em abril, devolve à liberdade os presos políticos. Com a vitória das forças antifascistas, o PCB vai à legalidade e participa da eleição para a Constituinte. Marighella é eleito como um dos deputados constituintes mais votados da bancada..1946 - Apesar do apoio de Prestes, o general Dutra, eleito Presidente da República, desencadeia repressão aos comunistas. Marighella participa ativamente da Constituinte com um dos redatores do organismo parlamentar. Conhece Clara Charf.1947 -Ainda no primeiro semestre é fechada a União da Juventude Comunista. Depois, é o próprio Partido que é posto na ilegalidade. Marighela coordena a edição da revista teórica do PCB, Problemas e vive um relacionamento com dona Elza Sento Sé, que resulta no nascimento, em maio de 1948, de seu filho Carlos. 1948 - No início do ano são cassados os mandatos dos parlamentares comunistas. Marighella volta à clandestinidade. Data desse ano seu romance com Clara Charf, sua companheira até o fim da vida.1949/1954 - Em São Paulo, Marighella cuida da ação sindical do PCB. Sob sua direção o PC se vincula aos operários, participa da campanha "O Petróleo é nosso" e organiza a greve geral conhecida como "dos cem mil" em 1953. Considerado esquerdista pela direção do Partido, é mandado em viagem à China. Lá é internado em razão de uma pneumonia. Depois, vai à União Soviética e volta ao Brasil em 1954.1955 - A morte de Getúlio Vargas e o início do governo de Juscelino Kubistchek permitem que os comunistas, embora na ilegalidade, atuem de modo mais visível.1956/1959 - O XX Congresso do PC da União Soviética inicia a desestalinização. O PCB adota a linha da "coexistência pacífica" pregada pela União Soviética. A vitória da Revolução Cubana, porém, contraria frontalmente as posições do movimento comunista internacional.1960/1964 - A renúncia de Jânio gera uma crise política. Jango toma posse e Marighella passa a divergir da linha oficial do PC, principalmente de sua política de moderação e subordinação à burguesia. Em 1962, divisão do PC dá origem ao Partido Comunista do Brasil - PC do B.1964 - Com o golpe de abril, instaura-se a ditadura militar. Perseguido pela polícia, Marighella entra num cinema do bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, e lá resiste aos policiais até ser diversas vezes baleado, espancado e finalmente preso. Sua resistência transformou sua prisão em um ato político que teve repercussão nacional. É solto depois de 80 dias, depois de um habeas corpus pedido pelo advogado Sobral Pinto.1965 - Escreve e publica o livro "Por que resisti à prisão", em que aponta sua opção por organizar a resistência dos trabalhadores brasileiros contra a ditadura e pela libertação nacional e o socialismo.1966 - Publica "A Crise Brasileira", onde aprofunda suas posições críticas à linha do PCB, prega a adoção da luta armada contra a ditadura, fundada na aliança dos operários com os camponeses.1967 - Na Conferência Estadual de São Paulo as idéias de Marighella saem vitoriosas por ampla maioria - 33 a 3 -, apesar da participação pessoal e contrária de Luiz Carlos Prestes. Vendo que a derrota no VI Congresso era iminente, Prestes inicia um processo de intervenções nos Estados, para impedir a participação de delegados ligados à corrente de esquerda. Marighella viaja a Cuba para participar da conferência da Organização Latino-Americana de Solidariedade-OLAS. O PCB envia telegrama desautorizando sua participação e ameaçando-o de expulsão. Disso resulta uma carta dele rompendo com o Comitê Central do PCB e afirmando que ninguém precisa pedir licença para praticar atos revolucionários. Como represália, é expulso do Partido Comunista. Retorna ao Brasil e funda a Ação Libertadora Nacional-ALN e dá início à luta armada contra a ditadura militar.1968 - Marighella participa diretamente de diversas ações armadas recuperando fundos para a construção da ALN. No primeiro de maio, em São Paulo, os operários tomam o palanque de assalto, expulsam o governador Sodrée realizam comemorações combativas do dia internacional dos trabalhadores. O Movimento estudantil toma conta das ruas em manifestações contra a ditadura que chegaram a mobilizar cem mil pessoas. Em outubro, porém, o Congresso da UNE é descoberto pela polícia e os estudantes sofrem grave derrota. Também no final do ano, torna-se conhecido o fato de que Marighella comandava parte das ações guerrilheiras.1969 - No início do ano, a descoberta de planos da Vanguarda Popular Revolucionária - VPR pela polícia antecipa a saída do capitão Carlos Lamarca de um quartel do exército em Osasco, levando um caminhão carregado com armamento para a guerrilha. Em setembro o embaixador norte-americano é feito prisioneiro por um destacamento unificado com integrantes da ALN e do MR-8 e trocado por quinze presos políticos. No dia 4 de novembro, às oito horas da noite, Carlos Marighella caiu numa emboscada armada pelos inimigos do povo brasileiro em frente ao número 800 da alameda Casa Branca, em São Paulo, e foi assassinado. Sua organização, a ALN sobreviveu até 1974.

QUINTA-FEIRA, 12 DE NOVEMBRO DE 2009:"INDIFERENÇA"

A atitude do Estado frente ao indivíduo alterou-se em seu cerne. Tornou-se social o indiferente Estado liberal, imbuído de uma determinada moralidade, a de manter a paz social; e, concomitantemente, viu-se contagiado por um sentimento de justiça, devendo assistência ao mais fraco, mas sem que isso viesse desorganizar as empresas da iniciativa privada, de modo a assegurar, também, a própria existência de trabalho. Na sua posição fiscalizadora, a serviço da concórdia, compulsoriamente, o Estado reduzia a um acordo de classes, nos termos da lei, a luta de classes apregoada por Karl Marx. Na racionalização da democracia, estampava-se um reforço da idéia de soberania popular. Para salientar o seu rompimento com o passado das monarquias, as Constituições desse período, como a indicar o Direito organizando tecnicamente o Estado, declararam que “Todos os poderes emanam do povo e em nome dele são exercidos”. Constata-se que as reformas, significando alteração sensível do Estado, dependem da opinião do povo, resultam do seu sufrágio plebiscitário, são conseqüência do seu enérgico sentimento.Sendo a democracia regime político cujo ideal se prende a uma identificação entre as vontades dos governantes e governados e variada pela possibilidade de diálogo, este não se verificaria, obviamente, se fossem incontrastáveis os atos governamentais. Ao invés de eventual oposição às deliberações políticas, ver-se-ia submissão a elas, transformado então o diálogo em monólogo, peculiar, este, aos regimes autocráticos. Também o reconhecimento das limitações jurídicas do exercício do poder resultaria da índole e da natureza do Estado democrático, nascido ou não daquele mesmo enérgico sentimento, da opinião do povo. (Marcus Moreira Machado)

QUARTA-FEIRA, 11 DE NOVEMBRO DE 2009:"CAPITAL E TRABALHO: LITÍGIO"

A concepção universal, até a primeira guerra mundial, no século XX, continuara sendo a individualista, mesmo ante o reformismo de crescente conteúdo socialista que, pregado com o nome de conciliação entre capital e trabalho, fora adotado pelos mais importantes governos europeus. Esta sugerida contradição, ante a dualidade verificada entre estrutura liberal do Estado e programa socialista do Estado, tem a sua explicação na ocorrida maior intervenção estatal no litígio entre o capital e o trabalho, sob a alegação de dever do Estado em manter a ordem pública. Uma vez que o conflito se acentuava, o Estado precisaria resolvê-lo não mais através da autoridade, porém, pela mediação; a sua atuação se daria , agora, mais por advertências às partes que entre si se opunham, ao invés dos anteriores decretos. De fato, o Estado assistia quase que inerte aos distúrbios que não conseguira prever. E sob a ameaça desses movimentos à comunidade, deixando o seu silêncio, acreditou ser possível ensejar voluntária harmonia entre as duas categorias. Contudo, como a realização da democracia se dá pelo sistema representativo, através do voto anônimo, uniu-se o proletariado, e, por suas cooperativas, sindicatos e associações, se fez representar nos parlamentos, reclamando, daí, normas legais que assegurassem as suas reivindicações. Em prol da população operária, a cada dia maior, veio a legislação reformista, constituída de leis sociais que, visando humanização das condições de trabalho, não implicava na destruição dos postulados liberais, isto é, do individualismo, do regime representativo, do povo como fonte do poder público, enfim. Ainda não se distinguiam os contornos da vida econômico-social com dos assuntos do direito civil.[1] A guerra de 1914 modificaria tal concepção do mundo. Viu-se a queda dos regimes tradicionais que na Europa tinham até então impedido a democratização do ocidente. O direito quis opor-se à força. Todo o idealismo desenvolvido durante o conflito mundial foi dirigido para o “homem” como unidade democrática, a ser libertado das antigas opressões. Por isso, o Tratado de Versalhes, formulando o princípio das democracias orgânicas, reconheceu o direito de disporem os povos do próprio destino. Como norma de pacificação social em todos os países, estipulou as garantias gerais do trabalho. Desapareceriam as últimas liberais-democracias, cedendo terreno à era da social-democracia. (Marcus Moreira Machado)

TERÇA-FEIRA, 10 DE NOVEMBRO DE 2009:"A LIBERDADE QUE CERCEIA"

Nas democracias, afora o grande limite do poder público, representado pela Constituição, há ainda para o fim de obstar às demasias que queiram ou possam desfigurar- lhe, a lei, compreendida como norma que sujeita o Estado, em garantia dos direitos individuais. Na delimitação do Estado pelo indivíduo, a autoridade é cerceada pela liberdade; a força é constrangida pelo direito positivo, vez que a ação governamental é dependente do consentimento do povo. Nota-se que à realidade do poder constituído se antepõe a metafísica da vontade consciente da comunidade, manifestada através da livre expressão dos partidos políticos. O Estado, por seu turno, não reconhece outras formas de vontades soberanas senão as provenientes dos partidos políticos, considerando que a soberana vontade do cidadão revela-se pelo sufrágio universal. Afinal, as suas idéias deverão, em consonância com o regime representativo, nascer dentro dessas agremiações partidárias. As distorções ao regime democrático não pressupõem a sua necessária extinção. Antes, corrigí-lo torna-se, nesses casos, imperioso, no intuito de conservá-lo. A própria democracia será então meio para extirpar tudo o que pretenda lhe aviltar, de maneira, pela intensa publicidade das afrontas que pretendam-na fragilizada, execrar publicamente os que querem trair a própria vontade soberana da comunidade. Primordialmente, teremos como verdadeira concepção da democracia, na sua continuidade, a moralidade geral, forjada no funcionamento da própria opinião como juiz supremo. Este regime de opiniões, todavia, será ou não evoluído de acordo com o padrão da opinião geral, isto é, se esta for insensível à imoralidade a lhe corromper o regime político, haverá, por conseqüência, uma legitimação dos escândalos marcados na corrupção. Daí às revoluções, em supressão dos sistemas idealistas em proveito de novos equilíbrios, apenas um curto passo. É quando se estabelece a indispensabilidade de escolha entre a reforma ou a revolução.
(Marcus Moreira Machado)