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sexta-feira, 18 de setembro de 2009

SEGUNDA-FEIRA, 12 DE OUTUBRO DE 2009: "NEUTRALIDADE"

É preciso reconhecer que a ciência, enquanto produto humano, está integrada no processo social e político total. Os cientistas, por uma questão de princípio e método, recusam-se a ditar “normas” à sociedade, pois aspiram a ser supraculturais, mas, paradoxalmente, intervêm cada vez mais na orientação efetiva da sociedade, e com isso influenciam a moral, mas de modo “não moral”. Por detrás da dicotomia ciência/aplicações, oculta-se a idéia de que a “Ciência” tem um estatuto transcendente relativamente à sociedade. Ela seria intemporal, estranha às vicissitudes sócio-culturais. Os pesquisadores elaborariam conhecimentos que não pertenceriam a nenhuma época, a nenhum país. Os cientistas devem ser honestos, não podem trapacear com suas experiências e com os seus resultados. Todavia, trata-se de uma “ética” puramente “interna”, consistindo apenas no respeito às normas em vigor. Só conta a procura da Verdade; e vista desse angulo, a ciência seria autônoma e neutra: ela se dá suas próprias normas, não havendo deontologia impondo aos pesquisadores deveres para com a sociedade. Esta dá a sua ajuda às pesquisas, mas é porque estima que a procura da Verdade deve ser compreendida. Isso não compromete o postulado da autonomia e da neutralidade dos cientistas; em virtude de um contrato implícito, eles têm por missão aumentar os conhecimentos, devendo deixar de lado as questões sociais relativas ao objeto de sua pesquisa. O poder político e as demais forças sociais não interferem na “Ciência Pura”.
(Marcus Moreira Machado)

domingo, 13 de setembro de 2009

DOMINGO, 11 DE OUTUBRO DE 2009:"RENASCENÇAS E ILUMINISMOS"

Indubitavelmente, confirma-se presente a vigência de uma ordem “dialética” entre os fatos e as idéias, estabelecendo vínculo entre todos os momentos da história, sob a égide da constante transformação, em absoluta confirmação de que, face a evolução do pensamento, nota-se um esquema ou “lei histórica” pela qual “a todas as Idades-Médias se seguem sempre outras Renascenças; como a estas outros tantos Iluminismos, a abdicarem, por esgotamento, em novas Idades-Médias. E nesta regra, com certeza, situa-se a concepção de Estado, já que é a norma das originais e necessárias exceções. Assim, a forma grega de Estado situa-se, como exemplo, no contexto das limitações econômicas e políticas da sociedade grega, logicamente. Contudo, a idéia de Estado para os gregos nem sempre é expressa pela realidade social. Portanto, não podemos avaliar as teorias aristotélicas sob o único prisma de que, à época, escravos não tinham direito algum; o pensamento interage com o fato, e ambos se completam porque são efetivamente diversos, daí a dialética da evolução. Não se nega, todavia, que a concepção da ‘polis” trazia em seu bojo os caracteres da organização política grega, como extensão e população pequenas. Por isto, a especulação científica não deve se ater a um ou outro aspecto isoladamente, e sim ao sentido global da vida social.
(Marcus Moreira Machado)

SÁBADO, 10 DE OUTUBRO DE 2009:"ABSTRAÇÃO"

Através de um processo de integração, nota-se o Estado como individualizado aspecto de fenômeno único: não o do processo de constituição da norma, mas sim o da constituição abstrata do próprio Estado, ou 'sistema de competências' ,que dão eficácia ao direito como 'sistema normativo'. Essa concepção constitui a dogmática jurídica e o formalismo de Kelsen ao elaborar o conceito de Estado com elementos puramente legalistas – o Estado reduzido a um conjunto de instâncias referidas à criação, aplicação e controle da lei. Não há investigação da forma legal como expressão da vontade associada ou de classe. Ao contrário, expressa a concepção jurídica das relações sociais, vigendo nas fronteiras do método da sociologia jurídica em geral. Ora, no contexto desse aspecto formal, surge a escola de Viena, entre as doutrinas que afirmavam a existência do Direito Natural anterior ao fenômeno estatal e, por efeito, separavam o Direito do Estado; e as que entendiam uma estatalidade absoluta. Na escola de Viena é realçado o formalismo com a eliminação do dualismo Estado e Direito. No seu ideal de uma ciência jurídica pura, Kelsen afasta então qualquer concepção de Direito Natural. Para ele só há o direito positivo, que se apresenta num ordenamento gradativo de uma norma fundamental até as normas mais gerais.As diversas concepções de Estado, origens e fins, formuladas por pensadores como Platão, Locke, Rosseau e Marx, entre outros, conduzem ao entendimento do Estado de Direito advindo do Direito Natural, isto é, naquilo que é justo por natureza, muito embora seja idéia sem aceitação uniforme, admitindo teorias convergentes, entretanto, a princípios informadores deste Estado de Direito. (Marcus Moreira Machado)

SEXTA-FEIRA, 9 DE OUTUBRO DE 2009:"NO RUMO DA SOCIOLOGIA"

Por um lado, a concepção evolucionista da humanidade entende que o Estado surge como essencial componente da sociedade humana, advindo com o primeiro agrupamento humano, e devendo perdurar enquanto este existir. Por outro lado, temos a concepção que compreende o Estado como realidade histórica, exclusivamente. Em geral, contudo, confirmamos a observação de três fundamentais tendências: a primeira, entendendo que o Estado existe em função da relevância dos objetivos éticos e sociais; a segunda, considerando os elementos concretos, entende o Estado como sendo o conjunto destes; e, a terceira, partindo da premissa de uma natureza jurídico-formal, compreende o Estado como uma realidade normativa. Há de se notar, todavia, que o Estado é um ente complexo, no qual encontramos a essência destas correntes, consideradas, por conseqüência, tais divergências inexpressivas e desprovidas de fundamento, por apresentarem aspectos inseparavelmente ligados ao Estado.Não obstante, ainda a teoria da integração, a de idéia antiga de que o fenômeno estatal é resultado de um processo no qual o corpo político tende a uma unidade orgânica onde os indivíduos, embora subordinados, são partes distintas do todo, cuja integração se realiza em razão dos fins comuns indispensáveis à convivência. Ora, constata-se que tal teoria segue rumo direto ao campo da Sociologia, colocando-se em contraposição ao logicismo puro e, ainda, em confronto com o naturalismo lógico, na sua tentativa de revelar o fenômeno Estado como realidade social. Como aspecto essencial do Estado, a integração o vê como sendo a própria realidade estatal, através da adesão constantemente renovada por indivíduos e grupos, por atos e funções, à idéia diretriz da comunidade, aos valores ou às imagens espirituais coletivas, de tal sorte a constituir-se o Estado em uma realidade espiritual dinâmica, em incessante continuidade, num “vir a ser” perene.
(Marcus Moreira Machado)

QUINTA-FEIRA, 8 DE OUTUBRO DE 2009:"CONEXÕES"

A doutrina de Kant é apontada como uma das fontes do individualismo liberal, não obstante as colocações político-jurídicas, propensas às mais diversas interpretações. Fato é, contudo, que a sociologia jurídica, ou análise jurídica dos fenômenos sociais, ao conceituar o Direito e suas categorias, começa por se defrontar com uma dualidade aparente: o Direito como fato social e como norma, a ser e o dever ser, a justiça e a idéia de justiça, direito e legislação, numa perspectiva ainda essencialmente jurídica de fenômeno social ou, mais modernamente, numa análise sociológica do direito, reduzido, entretanto, à sua forma legal-ideológica. De qualquer modo, estas variações têm um ponto comum: mantêm à margem ou em breves notas distinções clássicas, contribuições acerca do sujeito jurídico, a recuperação do aspecto normativo do Direito. A concepção da lei como fonte do Direito procede a inúmeras e sutis conexões entre a realidade social e a realidade jurídica, invocando humanismo e liberalidade na elaboração e aplicação do texto legal, reconhecendo-lhe o significado social às avessas, como finalidade, na configuração de um Estado provisional. Essas conexões, entretanto, não ofuscam o fato de que a teoria liberal clássica persiste modernamente, embora sob sofisticada elaboração de conceitos. Permanece a idéia da teoria da vontade geral como fonte da legitimidade do poder, em seu ambíguo sentido: ora resultando na lei como sua codificação, cuja realização compete ao Estado liberal, e, neste caso, o direito é concebido como um corpo de regras que antecede a instituição estatal, aplicadas por imposição aos membros mais atrasados, e o Estado concebido como a organização de uma etapa da evolução jurídica, uma ênfase do jurídico em detrimento do estatal, pressuposto com que reconstitui historicamente a evolução jurídica; ora como vontade do Estado que se expressa pelo Direito, e, neste caso, o Estado é concebido como fonte, absorvendo a lei, num conceito legalista da fonte, pressuposto de que todo direito é o direito positivo e este é a lei do Estado. Aqui o Estado antecede a lei, em sua gênesis, que emerge quando o poder absorve o direito. Em face do normativismo e do formalismo liberais ergue-se o extremismo antinormativista e voluntarista, aberto para quaisquer arbitrariedades e injustiças. Já a concepção corrente é mais sutil, caracterizada pelo ecletismo, do direito e teorias a respeito do que venha a ser o ente estatal.
(Marcus Moreira Machado)

QUARTA-FEIRA, 7 DE OUTUBRO DE 2009:"NEXO"

Engels nos informa que a partir do instante em que não mais houver a sujeição de classes e desnecessária for então a luta pela sobrevivência individual, não haverá mais razão para a existência do Estado tradicional, pois não mais será necessária nenhuma força especial de coerção. Essa concepção gera inúmeras críticas, entre as quais a de que o Estado jamais desaparecerá; ele apenas sofrerá transformações determinadas pelas modificações da vida em sociedade. O criticismo kantiano, tratando então do problema político-jurídico, condiciona todos os direitos ao princípio da liberdade, entendendo-o como sendo um Direito Natural, com o indivíduo no centro do interesse jurídico do qual resulta o Estado. Há um direito natural, isto é, um nexo, que torna a sociedade possível. Kant acrescentou: pela “razão pura”, chega-se à verificação de que o Estado é essencial. O seu fim é liberdade, na coexistência da liberdade de um com a de todos os demais, e ainda o fundamento, o preceito, absoluto, imperativo, categórico, de que o estado é a interlimitação de vontades individuais.Na concepção kantiana, coerentemente com a tradição do Iluminismo, existe um “estado de natureza” anterior à sociedade civil, esta nascida em virtude de um contrato social. Este Estado “pré-jurídico”, porém, não é desprovido de juridicidade, como nas concepções de Locke, Hobbes e mesmo Rosseau; há uma situação onde existe o Direito Natural formal, baseado no imperativo categórico, qual seja, o dever incondicional e “a priori” de cumprir a lei. Tal como Rosseau, Kant estabelece no contrato social a manifestação da vontade geral; no entanto, como uma idéia “a priori” que fundamenta a autoridade do Estado, um pressuposto de caráter lógico em relação ao Estado empírico, e resultando de um pacto – de conteúdo lógico e não histórico -, destinando-se à proteção dos direitos individuais, da ordem e da liberdade, que devem ser encontrados em equilíbrio. Ao que parece, a limitação existente em Kant se encontra na noção de vontade do povo, pois é desta vontade manifesta que surge a lei que pode ou não restringir a liberdade ou outros direitos. Igualmente como em Rosseau, temos o elemento soberania que, residindo no povo e sendo manifestado, origina a lei, de onde conclui-se ser a soberania o mesmo que o poder de legislar, estando este com os delegados do povo. As idéias de Kant, inegavelmente, informam o positivismo jurídico, o qual entende o Estado como fonte única do Direito, e reduzindo este à lei; esta, por seu turno, por representar a vontade do povo, não pode ser discutida como sendo justa ou injusta, porque o seu fundamento está no abstrato e vazio “imperativo categórico”.Ora, o prestígio da lei na doutrina de Kant explica em parte a sua afirmação de que não pode haver pretensões perante a lei, pois a lei para ele não é uma limitação que o Estado impõe aos indivíduos, mas é antes uma limitação que os indivíduos se impõem reciprocamente para a concordância das autonomias respectivas.
(Marcus Moreira Machado)

TERÇA-FEIRA, 6 DE OUTUBRO DE 2009:"CONTRAPOSIÇÕES"

Há quem indique Grotius como fundador da escola do Direito Natural. Em que pese a cabal importância desta escola, Grotius deve ser visto como reativador, e não fundador das idéias jusnaturalistas que, em função das realidades de sua época, apresentam novos elementos, relativamente aceitos por seus adeptos. Esta escola concebe como fonte do Direito Natural a razão humana, valorizando-a de forma tal que afasta totalmente qualquer crença em Deus, oferecendo à vontade uma autoridade independente. Parte daí a formulação dos dois postulados básicos desta escola, fundados no estado de natureza e no contrato social. Em contraposição a estas teorias fundadas no contrato, surge a doutrina de base sociológica, procurando justificar a origem do Estado em virtude da violência; concepção esta defendida por Gumplowicz, Oppenheimer, Lester e Cornejo, no entendimento de que o Estado, ao contrário dos contratualistas, não nasce pelo consentimento ou pelo pacto voluntários, mas sim como um fenômeno social representado por conflitos étnicos e, principalmente, pela subjugação de um grupo mais forte sobre outro mais fraco, para cuja dominação haverá necessidade de uma organização. Oppenheimer ressalta o aspecto de uma forma de organização social – Estado – cujo objetivo se dá em razão de disciplinar o grupo dominado, defendendo a autoridade, a conquista e a exploração econômica pelo grupo dominador, algo que, sem dúvida, se identifica na história da humanidade, em que presente está a violência a criar Impérios e Estados. Este Estado apresenta-se como verdadeira aspiração popular, resultante do binômio “povo-nação”, entendido este como um conjunto de cidadãos cuja identidade resulta em unidade que o Estado representa, e que tem como substrato real esse efeito de isolamento que suas relações econômicas típicas manifestam.[1] Não é então uma unidade, mas uma unidade de luta de classes. É o que de certa maneira se nos apresenta na atualidade com a ideologia capitalista no sistema neoliberal. Já Engels, Marx e Lenine, em vez de se aterem à violência como fonte originária do Estado, ressaltam a importância econômica da história. E sua concepção, paralelamente à consolidação dos Estados clássicos, é forjada na mística da insurreição social. Introduz-se na filosofia política uma obsessão oposta à dos racionalistas. Estes queriam, pela Razão, humanizar o Estado, declarando tudo para o povo, nada contra o povo. Aqueles pretendiam acabar com a “classe dirigente”, ou com o próprio Estado, considerando-o a injustiça em forma de uma opressão dispensável. Os inimigos do Estado, pois, pretendiam aniquilá-lo. Os gregos, dando a “família” como base, e os romanos, ao contrário, considerando a propriedade como fundamento, viram o poder público em função da realidade essencial, em conformidade com a integridade da “família”, o gozo pacífico dos “bens” honestamente adquiridos. É o “minimum” de Estado. Fora daí teríamos o não-Estado, a violência contra sentimentos irredutíveis do homem, representados pelo seu lar, a sua coisa, a sua personalidade mesmo.O ambiente doutrinário para o desenvolvimento dessas idéias foi o “materialismo econômico”, formulado por Marx com a sua teoria da “luta de classes”, partindo do pressuposto de que a história conhece um determinante – causa absoluta da evolução: o fator econômico; e chegando à conclusão de que os operários de todo mundo deveriam unir-se. Por conseqüência, criou assim a Primeira Internacional Comunista, em 1864. Esta teoria fundada no materialismo histórico, por acentuar a influência dos fatores de produção na sociedade, encontrou adeptos entre os socialistas, e identifica o Estado, o povo e o próprio direito, uma vez que o organismo comunista, quando atingido, é o povo no poder.
(Marcus Moreira Machado)

SEGUNDA-FEIRA, 5 DE OUTUBRO DE 2009:"A FORÇA QUE SE IMPÕE"

A confirmação de que o governo pacificou os Estado resulta da renúncia à ferocidade; e essa renúncia, embora indispensável, a fim de evitar a barbárie, é voluntária. Ambiente de equilíbrio, o Estado tem a sua aceitação como a possibilidade de coexistência social; mas porque assim quiseram os indivíduos. O indivíduo, diversamente do que afirmara Aristóteles, não é um animal político, mas um ser racional. Já Spinosa aplicou à idéia política as antigas convicções religiosas, judeu de origem portuguesa que era. Para Spinosa a felicidade não é prêmio de virtude, senão a própria virtude, como pensavam os israelitas. A moral do êxito é o próprio êxito. A preeminência do mais forte explica o Estado, que se originou da luta, como a situação em que há vencedores e vencidos. O Estado deve durar, sem limite, como uma força que se impõe, ou, cessando de impor-se, deixa de ser. Tanto Locke como Hobbes, verdade é, partem da idéia inicial do estado de natureza e evoluem até acentuarem a teoria contratual, no século XVII, o fazendo em meio a movimentos revolucionários, entre os quais a ditadura de Cromwel e a desordem que imperava entre os ingleses. A obra de Hobbes, “Leviathan”, tem por objetivo o esforço para descobrir um meio de paz, que será o dever de obediência ao soberano; afirma a existência de um estado natural e primitivo do ser humano, que vivia isolado e independente, no barbarismo e na insegurança. Nesse estado natural, o elemento permanente é o conflito, a guerra de todos contra todos, em que o homem, sem lei moral, se acha em constante luta com os seus semelhantes, como o lobo do próprio homem. Hobbes verifica que o Estado de natureza se contrapunha ao progresso e que os indivíduos, se apercebendo disso, bem como da necessidade natural de segurança, abdicaram dos seus direitos em razão de uma assembléia ou de um indivíduo, através de um contrato que, por conseguinte, originou um Estado onipotente e absoluto, com o atributo de um deus moral, como princípio unificador implícito em toda sociedade, excluindo assim o anterior estado de natureza. O Estado surge como ilimitado, demonstrando uma posição extremada em relação à soberania absoluta, esta resultante do fato de o Estado ser não só o ordenador do direito positivo, visto que entende o direito como criação do Estado, mas ainda o próprio criador da justiça. Isto se dá em razão de que, embora resultante de um contrato, o Estado não se apresenta como parte contratante, restabelecendo-se então o princípio absolutista, em identificação do direito com a vontade do soberano. (Marcus Moreira Machado)

DOMINGO, 4 DE OUTUBRO:"A PREMISSA DO CONSENTIMENTO"

No trabalho de melhor situar a problemática de conhecer a origem do Estado, encontramos a eclética participação de estudiosos da Sociologia, da Ciência Política e, principalmente, da Ciência Jurídica, cujas formulações se situam, em amplo sentido, nas teorias da origem contratual do Estado, da origem violenta do Estado pela força, na interpretação econômica da gênese do Estado. Ainda na concepção contratualista do Estado, nota-se a importância da influência do consentimento na origem estatal, apregoadas por Tomás de Aquino e até mesmo por Aristóteles, sob novo aspecto, contudo, por se traduzir na vontade como elemento precípuo e uno na concepção do Estado com a forma de contrato político. Trata-se de teoria informadora da sua época, muito influente nos movimentos revolucionários da Inglaterra e da França, com inúmeros adeptos partindo da premissa do contrato, entendendo, apenas de modo diverso, a manifestação desta vontade que viria a originar o fenômeno estatal. Enquanto, pois, alguns contratualistas ressaltaram um poder absoluto do Estado, como Hobbes, outros, como Locke e Rousseau, tiveram as suas concepções fundamentadas numa filosofia liberal do Estado, não se distanciando nenhum deles, todavia, de uma estatalidade do direito. Dissera Locke que o Estado resulta de um contrato entre o rei e o povo, que se rompe quando uma das partes lhe viola as cláusulas.[1] Jean Jacques Rosseau completou, afirmando tratar-se de um “Contrato Social”, mediante o qual o governo é delegado do verdadeiro soberano, o povo. Este, então, cedia direitos naturais – peculiar liberdade ao homem – em troca de direitos civis, de bem-estar comum; governo, portanto, segundo Rosseau, é utilidade, e utilidade aquiescendo com a boa-fé do acordo inicial. Sendo a autoridade constituída pelo governo geral – a maioria soberana – para realizar seus úteis ideais, seria absurdo o governo contra o povo, isto é, o procurador contra o mandante. Política seria, por definição, filha da Moral e da Razão. E por isso mesmo, Rosseau, cujo pensamento exerceu incomparável influência sobre a Assembléia Constituinte dos Estados Unidos e também sobre a Revolução Francesa, lamentava o contraste entre a sua arquitetada concepção e a realidade, entre o idealismo da Moral e da Razão e o triunfo de fatos e práticas a contrariá-las.Tanto Locke quanto Rosseau possuem as suas concepções em divergência à doutrina de Hobbes, este acompanhado de Spinosa, sucedendo ambos a Maquiavel, no ensinamento de que o Estado é força, forjado no conflito inicial. Hobbes concebeu a humanidade primitiva como uma confusão de gente bruta: “homo homini lupus”, o homem, lobo do homem.
(Marcus Moreira Machado)

SÁBADO, 3 DE OUTUBRO DE 2009:"FORÇA PÚBLICA E ESTADO"

A idéia de “finalidade” do Estado tem sido forte condicionante para a concepção de unidade social, justificando muitas vezes formas estatais diversas, dentre as quais as totalitárias; e indicando diversificadas considerações quanto ao seu entendimento, de maneira a fundamentar a afirmação de que a finalidade justifica a convergência do grupo social, a sua absorção e subordinação ao Estado, tal qual a idéia encontrada em Maquiavel, qual seja, a de que “ os fins justificam os meios”. Na mesma direção, Gustavo Hugo, Savigny, e o historiador Eicckorn, adotaram, apressadamente, na Alemanha essa concepção realista e simples do fato jurídico e político, tirando proveito de duas idéias essencialmente germânicas – espírito da raça e tendência a um ilimitado progresso. Não justificavam, todavia, o Estado, limitando-se a explicá-lo. Ora, na verdade, remontando a Aristóteles, para quem, como já visto, o homem naturalmente propende à sociedade e, por instinto, tem de realizar superiores formas sociais, a escola histórica é campo fértil aos ramos nacionalistas do pensamento jurídico moderno. Coube, pois, ao pensamento hegeliano transformar a história em juiz supremo. E, contemporaneamente, a concepção segundo a qual o Estado se apresenta com um fim e um meio, em termos de integração e finalidade, nos é dada pela doutrina aristotélica, a pregar que o Estado é unidade e multiplicidade, num só tempo. Para Aristóteles, o Estado seria a fase final de um longo desenvolvimento de integração, observada a unidade do fenômeno estatal como uma integração harmônica da pluralidade de indivíduos.O conhecimento da origem do Estado tem o seu valor na medida em que, informados dos pressupostos, das conveniências e necessidades humanas, certamente se poderia partir para uma concepção de Estado que atendesse efetivamente a realidade jurídico-social-econômica da contemporaneidade. Assim, por exemplo, para Friedrich Engels, a força pública é tão velha quanto o Estado, ou seja, um dos traços característicos essenciais do Estado, segundo Engels, é a existência de uma força pública separada da massa do povo, razão pela qual os franceses do século XVIII não falavam de nações civilizadas, mas sim de nações policiadas.
(Marcus Moreira Machado)

SEXTA-FEIRA, 2 DE OUTUBRO DE 2009:"PROVIDENCIALISMO E HEGEL"

Não se pode ignorar que essa presunção de intimidade entre o rei e a Providência Divina continha vestígio oriental, numa acepção primitiva, assírio-judaica, da autoridade histórica. Por isso a teoria providencialista, doutrinando que Deus não interfere na escolha ou no apoio aos governos, que o poder em si, este sim é sagrado; sublime é apenas a organização coercitiva, a boa ordem. Esta doutrina determina, pois, que o Estado resulta da bondade de Deus, que socorre os homens, e não através de determinada forma política, pessoa ou regime, mas do poder como ordem jurídica que efetua um benefício moral, a par da justiça, na sociedade. Assim, conforme a concepção, evidentemente, o Estado, divino na sua essência, deve ser governado pelo poder tradicional, legítimo porque antigo.Na conceituação do Estado moderno faz-se imprescindível, antes, a constatação, na análise histórica da formação do Estado, de maneira geral, da complexidade de fatores que, em diversas épocas, são elementos vitais, não só para a compreensão do fenômeno estatal, como também a da sua evolução. Pois, ante o surgimento de novas realidades do conjunto social, novas concepções dos homens surgem igualmente, com tendências voltadas à procura de um conceito uniforme e universal, que, por sua vez, acabam por gerar uma multiplicidade de outras concepções, sendo muitas ligadas por diversos aspectos, e outras se apresentando contraditórias e opostas. Por isso, verifica-se imenso manancial de conceitos e entendimentos, contudo, a ser questionado, visto que os indivíduos, sendo diferentes entre si, não podem ser totalmente absorvidos pelo Estado, nem este ser confundido com a sociedade. E, ainda, resta o fato dessa teoria se apresentar como uma concepção baseada tão-somente em aspectos sociológicos, em vários pontos configurando-se como modernizadora da teoria de Hegel, no que tange em fundamentos relevados pela escola histórica, para a qual o Estado, enquanto fato perenemente em evolução, cuja causa primária está nele mesmo, tem por finalidade a perfeição, através do tempo.
(Marcus Moreira Machado)

QUINTA-FEIRA, 1 DE OUTUBRO DE 2009:"NUM REINO DIVINIZADO"

No conflito entre a Igreja e o Império, o monarca, nos séculos XIII e XIV, se julga continuador dos cesares romanos. A multiplicidade dos feudos, porém, não lhes permite vida longa. As vilas, ricas, compram aos “ suzeranos” o direito de livre- administração: são as comunas do século XIII, que elegem os próprios magistrados, segundo o exemplo greco-romano. O rei vale-se desses minúsculos Estados, em conseqüência das levas de cavaleiros para as cruzadas, e do progresso das populações “burguesas” (dos “burgos”que se emancipam), para impor a esses feudos uma disciplina voltada à união. As nacionalidades formam-se pela concentração da autoridade, pela sujeição dos aristocratas isolados em seus castelos, pelo reconhecimento do poder central, capaz de assegurar a tranqüilidade econômica, a ordem civil, no âmbito sempre crescente da expansão de sua raça. As concentrações monárquicas resultam de guerras habilmente ganhas pelos reis, como também pelas concepções de ordem, de civilização, de “cidade”, que infiltram-se e generalizam os costumes. Então, torna a Igreja a emprestar o seu concurso, dessa feita, auxiliando decisivamente esse trabalho unificador, dando à pessoa do rei um caráter sagrado, à sua autoridade uma razão divina, à sua justiça um conteúdo religioso. A história explica o resto: a aproximação dos núcleos culturais pela identidade de língua, sentimento nacional, novas tendências econômicas, não mais militares, da vida coletiva. Assim, se por um lado Portugal, por exemplo, não conheceu o feudalismo, na Alemanha, entretanto, ainda na Guerra dos Trinta Anos, mais de trezentos Estados conservavam a desagregação medieval. Os “forais” dos portugueses, enquanto isso, definiam a autonomia das suas terras; e em 1350, o país todo estava dividido em municípios, com os seus conselhos, formando a nacionalidade, não tendo o rei consentido que os nobres usurpassem os direitos municipais; aí a unidade nacional coincide com o estabelecimento da monarquia. A realeza que funda o Estado moderno associa-se às concepções latina e feudal da autoridade: “imperium” e “senhoriagem”. Do fato –supremacia do soberano– se chega ao direito –a declaração da “soberania”– como atributo do Estado, mas personificada no rei. Por essa idéia de poder público nenhuma autoridade é superior à do monarca, e ele a desfruta como representante de Deus para manter os homens em cristã sociedade. A origem de sua força é “providencial”: realiza a ordem que agrada a Deus e assegura o culto. Apropriadamente à situação dessas monarquias, poderosas, trata-se do poder absoluto e perpétuo de uma república (Estado), caracterizado, por vontade suprema, sem superior que a limite. Na verdade, repete-se a evolução da autoridade, vista antes em Roma e Grécia: o poder dividido e restrito simplifica-se, totaliza-se; e o soberano é absoluto. E como tal será conservada até a Revolução Francesa.
(Marcus Moreira Machado)

QUARTA-FEIRA, 30 DE SETEMBRO DE 2009:"DOMÍNIOS CIVIS"

Depois da extinção, no século XIII, dos Hohenstaufen, o domínio do Santo Império Romano sobre a Itália central e a Itália do norte se enfraqueceu, embora os imperadores alemães tenham continuado a ser coroados como reis e imperadores da Itália até o tempo de Carlos V. Em conseqüência desse enfraquecimento imperial, surgem diversas cidades-estados quase independentes ao norte de Roma, a capital dos papas. Os caracteres fundamentais do Estado como base territorial e soberania surgiram em seguida. Têm origem a partir de 1648, quando da assinatura da paz de Westphalia, no término da Guerra dos Trinta Anos, conflito esse que possibilitou uma aliança do poderoso cardeal Richelieu, ministro francês de Luiz XIII, com os príncipes protestantes, já que, hábil administrador, tal coligação era expressiva a Richelieu, tenaz na realização de seus planos de política externa, no sentido de abater o poderio da Casa dos Habsburgos, dominante na Áustria e na Espanha. É necessário que se observe que até então o que se via era a subdivisão do Estado em domínios de propriedade de um senhor, rei na sua pequena terra, nada em comum com o Estado clássico, mais um conceito de direito privado, não de direito público; o poder aí provém da propriedade, produtora de obrigações e regalias que os romanos não conheceram. Em razão desse direito privado, o proprietário exerce, nos limites de seu feudo, uma soberania que resulta de relações civis: é protetor dos vassalos, cobra serviços e impostos em virtude da “concórdia” , a convenção entre ele e os subordinados; cumpre um contrato virtual. Recebe o auxílio dos protegidos e, por seu turno, acode em socorro de outro senhor, a quem está ligado pela mesma solidariedade defensiva. Este último, geralmente é o rei, soberano, “Superanus” “primus inter pares”, cuja senhoria só depende de Deus; é o sucessor enfraquecido e pobre do imperador romano, do antigo príncipe, e cuja política consiste em robustecer o poder real para restabelecer a unidade da monarquia.
(Marcus Moreira Machado)

TERÇA-FEIRA, 29 DE SETEMBRO DE 2009:"PODERES E ECLESIAS"

Na força das concepções de Agostinho, a catolicidade repercutiu na visão de uma Igreja como corpo político, de onde encontramos a origem do poder temporal dos papas, e também a compreensão do Estado como fruto de ordem divina. Curiosamente, à época, a cidade fazia muitas coisas que contemporaneamente são feitas pelo Estado. Os problemas sociais achavam-se a cargo da administração da cidade ou correspondente organização municipal. A regulamentação do comércio era atribuição das corporações em comum acordo com o conselho. Competia à Igreja o cuidado dos pobres. O conselho velava ainda pela proteção dos muros da cidade; superatento aos seus deveres sociais, o conselho também era o superintendente das provisões nos depósitos de víveres municipais, com a finalidade de garantir abastecimento nos anos de escassez. Esses depósitos ou armazéns existiam em quase todas as cidades, durante o século XV. Havia tabelas de preços para a venda de todas as comodidades, suficientemente altas para habilitar qualquer artesão a ganhar bem a vida, e para dar ao comprador uma garantia de qualidade dos bens vendidos. A cidade era também o capitalista principal; como vendedora de pensões vitalícias ou de adiantamento sobre heranças, fazia as funções de banqueiro de crédito ilimitado. Em troca conseguia os recursos para as construção das fortificações e para as eventualidades, com a compra do direito de soberania das mãos de algum príncipe sem dinheiro.Na sua maior parte, essas cidades européias eram repúblicas aristocráticas independentes, ou quase independentes. Muitas admitiam uma vaga suzerania da parte da Igreja, ou do Imperador, ou de um rei. Outras eram partes de reinos, ou mesmo as capitais de duques ou reis. A mais completa e esplêndida expansão dessa próspera vida de cidade dos fins da Idade Média ocorreu mesmo na Itália.
(Marcus Moreira Machado)

SEGUNDA-FEIRA, 28 DE SETEMBRO DE 2009:"ESBOÇO DA HISTÓRIA"

O Estado para Santo Tomás de Aquino é apenas um ser distinto dos indivíduos; o Estado é mesmo um organismo, não físico, evidentemente, porém, um organismo moral, uma espécie de corpo místico, como a Igreja, na sua própria concepção e na de São Paulo; é uma sociedade natural, distinta das sociedades constituídas por simples convenção ou contrato para quaisquer outros fins. Diversamente de Tomás de Aquino, Santo Agostinho, concebendo o Estado à maneira de Platão, o entende como cidade ideal, “civitas dei”, oposta à “civitas diaboli”, uma comunidade universal, cuja compreensão remonta ao comospolismo estoicista, reunindo os bons, os puros, e os santos. A Cidade de Deus, segundo a tese do majestoso livro de Santo Agostinho, iniciado em 412 e terminado em 427, será eterna, ainda que as cidades terrenas venham a desaparecer. Ora, a noção do Estado medieval é influenciada pela concepção da Igreja como corpo místico. O paganismo tinha sido abolido, tornando o Cristianismo a religião oficial de Roma. Quando, porém, a invasão dos godos espalhou o desastre afora, reapareceram as cerimônias pagãs, justificadas então na crença de que os antigos deuses, repelidos, tinham abandonado a cidade à sua própria sorte, e recuperar a prosperidade por cujo intermédio havia sido alcançada dependeria, pois, do seu retorno. Foi um período de dolorosas provações para a Igreja Cristã. Esperava-se trouxesse o Cristianismo a Era de Ouro, mas, ao contrário, trouxe ruína. Que poderiam dizer os cristãos à zombaria mordaz e aos insultos e perguntas escarnecedoras dos pagãos? Foi Agostinho quem pelos cristãos deu a resposta. Escrevera vinte e dois livros num só volume –a sua magistral “Apologia” –, que constituía-se num ataque. Os primeiros dez livros mostraram como Roma sofrera rudes golpes apesar de seu fiel culto aos deuses. Com habilidade, o grande retórico expôs os deuses pagãos e o seu culto a um ridículo devastador. E nas últimas doze seções contrastou as cidades humanas com a cidade divina, e a fé pagã com a fé do cristianismo. A obra de Agostinho procurou responder às principais dúvidas da época; um esboço histórico, de fato, escrito em estilo ferino e linguagem popular. Trabalho bastante humano e versando sobre os fundamentais princípios. A “Cidade de Deus”, a obra então por Agostinho escrita, eqüivale, segundo a sua concepção, à Igreja Católica no Santo Império Romano. O seu sonho, séculos depois, seria uma realidade histórica. E não por outra razão, acredita-se que sem Santo Agostinho o Cristianismo talvez não tivesse sobrevivido à queda de Roma e ao obscurantismo da Idade Média.
(Marcus Moreira Machado)

DOMINGO, 27 DE SETEMBRO DE 2009:"ORGANISMO MORAL"

Em Tomás de Aquino, a finalidade do homem reveste-se do próprio aprimoramento de sua natureza, meta que apenas a fé em Deus possibilitaria atingir: a lei divina é o guia do homem para sua realização eterna; já a lei natural, a que está intrinsecamente vinculada à natureza do homem, não alcança o sobrenatural e está, no mesmo sentido da lei positiva ou humana, voltada às utilidades comuns dos homens. O Estado torna-se uma instituição natural destinada a promover o bem de todos e, conseqüentemente, subordinado às leis divinas, sobrenaturais, uma vez que a Igreja, para Santo Tomás de Aquino, seria um Estado superior. O Estado para Santo Tomás de Aquino é apenas um ser distinto dos indivíduos; o Estado é mesmo um organismo, não físico, evidentemente, porém, um organismo moral, uma espécie de corpo místico, como a Igreja, na sua própria concepção e na de São Paulo; é uma sociedade natural, distinta das sociedades constituídas por simples convenção ou contrato para quaisquer outros fins.
(Marcus Moreira Machado)

SÁBADO, 26 DE SETEMBRO DE 2009:"DAS JUSTIÇAS"

Transformações sociais contribuíram para que na época medieval -sob influência do pensamento grego e da patrística- surgissem novas concepções sobre o Estado, destacando-se as de Tomás de Aquino e Santo Agostinho. E, certamente, na Idade Média, o conceito de Estado é produto da influência do intelectualismo grego, resultando ainda em nova visão humanística, dessa feita, sintetizada na caridade conseqüente do pensamento cristão. Assim, em Tomás de Aquino, o Estado é fundado na ótica teocêntrica do mundo, à maneira aristotélica, visto como realidade natural, tal como a família e as outras formas de convivência humana . Portanto, nesta noção de Estado, o homem é um animal social natural; a “civitas”, a “comunitas civitatis” e a “res publica” são tomadas como formas de convivência humana, derivada esta, contudo, da “lex aeterna”, quer dizer, expressão da inteligência da vontade de Deus. Trata-se, a bem dizer, do emprego dos fundamentais princípios da filosofia aristotélica concebida no conceito do “hilemorfismo”, forma pela qual o Estagirita uniu as idéias com a realidade das coisas, vinculando-se intimamente com o mundo fenomênico. Inicia-se com Tomás de Aquino a preocupação mais propriamente científica do Estado, em oposição à preocupação filosófica dos fundamentos. Na divisão do justo é que se verifica a influência de Aristóteles em Tomás de Aquino. O justo, quer político quer legal-político e quer político-natural. Da civilização helenística recebeu triparticipação do Direito em: Natural, “ Jus Gentium” e “Jus Civile”. E da patrística, a divisão, por ele aceita, em “Lex Aeterna”, “Lex Naturalis et Lex Humana”. A justiça é dividida por Tomás de Aquino, em conformidade com o pensamento de Aristóteles, em três aspectos: a justiça comutativa – aquela concretizada entre duas pessoas; a justiça legal; e a justiça distributiva. Estas duas últimas situando-se no campo da incidência estatal sobre os indivíduos e vice- versa. (Marcus Moreira Machado)

SEXTA-FEIRA, 25 DE SETEMBRO DE 2009:"ALHEIO OU ABAIXO"

Também outrora o poder e a ganância destruíram as concepções estóicas de um estado de natureza, no qual inexistiriam fronteiras e distinções entre os homens. Época em que, paradoxalmente, o poder ideal do Estado Universal prestou-se á busca da felicidade coletivo, e ao mesmo tempo á ânsia e a manutenção dos privilégios daquele que ao longo desse período histórico detiveram para si o poder, este distanciado do objetivo de beneficiar a todos igualmente. Todas essas correntes filosóficas concorrerão para a formação da jurisprudência romana, substancialmente a informadora do direito ocidental. O Direito Natural, revestido da essência da idéia do direito, a racionalidade, encarnando as tendências à codificação e ao entendimento da jurisprudência como dogmática. E também a concepção de que o direito é o justo, quer no justo natural quer no legal. São os preceitos que impregnaram o conteúdo do direito ocidental, enfim. Direito esse inserido no Estado-império, fruto da evolução histórica onde a Cidade-Estado, idealizada pelos filósofos gregos Platão e Aristóteles, sofreram mudanças. A nova espécie de Estado evolui ao tempo da evolução política de Roma. A fase original dos negócios romanos foi a de uma aristocracia de tipo muito pronunciado; e a história interna de Roma, por dois séculos e meio, desde a expulsão do último rei etrusco, Tarquínio, o Soberbo, até o início da primeira guerra púnica, em 264 A.C., consistiu na luta pela supremacia de duas ordens: a patrícia e a plebéia. Essa luta apresentava uma estreita semelhança com a que se processou entre a aristocracia e a democracia nas Cidades-Estados da Grécia. Como na Grécia, classes inteiras da comunidade, os escravos, os libertos, os homens livres pobres ou sem propriedades , os estranhos ou estrangeiros, e muitos outros, jamais participaram da luta, deparando-se completamente alheios ou abaixo do conflito. Os patrícios fizeram uso mesquinho de sua vantagens políticas, enriquecendo-se através das conquistas nacionais, à custa não somente do inimigo derrotado como também dos plebeus pobres que, tendo abandonado as suas terras, endividaram-se durante o serviço militar. Os plebeus foram excluídos de qualquer participação nas terras conquistadas; os patrícios as dividiram entre si. A existência do dinheiro, por outro lado, aumentou consideravelmente as facilidades do usuário e as dificuldades do devedor por empréstimo.
(Marcus Moreira Machado)

QUINTA-FEIRA, 24 DE SETEMBRO DE 2009:"PLENITUDE"

Tanto o Estado quanto o direito derivam da natureza, como o objetivo de proporcionar a felicidade coletiva. Já o desenvolvimento da filosofia estóica ocorre na fase de transição da civilização grega para a romana, verificando-se, assim, o aparecimento do estado universal em substituição a “polis”. Perdia a Cidade-estado a auto-suficiência em razão de um novo organismo político nacional. Essa nova concepção proporcionou a implantação do estado imperial, resultando em visão cosmopolita, onde os preceitos essenciais da filosofia estóica colocam a sociedade humana como decorrência da natureza do homem, que seria então naturalmente raciona e irmão de todos os demais. As preocupações cosmopolitas dos filósofos deste período levam ao entendimento de que o bem supremo é a felicidade – a grande virtude -, identificada com o saber. O Direito Natural situa-se acima da lei positiva porque a informa daquilo que é justo ou injusto. Nesse sentido, observamos, em nossos dias, uma certa convergência aos mesmos princípios informadores do Direito Natural, no sempre crescente questionamento a respeito do binômio ‘Direito e Justiça’, uma preocupação básica do homem atual, que hoje vive no mundo profundamente marcado pelos progressos da ciência da técnica os quais imprimiram á vida humana a velocidade e o sentido de completa subjugação da natureza, o espírito de grandiosidade auto-suficiência e imediatismo; num vertiginoso avanço ao futuro, com a história registrando, no entanto, a formidável ambigüidade desse progresso. O real humanismo foi, isso é patente, assolado por esse desenvolvimento do espírito técnico, suscitando, então, uma necessidade de retorno ás origens. Trata-se de um contexto onde a justiça assumiu em todos os lugares um valor inestimável, ansiosamente desejada que ela é por todos quantos vivem o drama da história humana. A justiça percebida em sua plenitude, guiando os rumos de uma humanidade marcada pelo sofrimento de guerras, crises econômicas múltiplas, rupturas políticas várias, uma humanidade temerosa do total extermínio, a padecer, muitas vezes, do flagelo mais vil, a fome.
(Marcus Moreira Machado)

QUARTA-FEIRA, 23 DE SETEMBRO DE 2009: "CONDICIONANTES"

O homem é naturalmente um animal social, culminado no Estado, que se constitui em meio natural de conviver e conseguir a felicidade. Assim pensando é que entenderemos a relação estabelecida por Aristóteles a propósito das formas de governo. Tanto a monarquia, a aristocracia e a democracia são formas boas, se o exercício do governo seja dirigido em proveito do bem comum. Dotado de uma inteligência terrivelmente sã e luminosa e surpreendentemente realista e destituída de entusiasmo, Aristóteles, se por um lado aprovou a monarquia e a escravidão e a subordinação da mulher como instituições racionais, por outro lado, sempre esteve ansioso de compreender os fatos e de conseguir algum conhecimento ordenado das realidades naturais e humanas, as quais estavam, então, manifestamente triunfantes sobre os sonhos criadores da geração precedente. E nesse afã, não poupou sequer o mestre, Platão, criticando-o por exilar de sua utopia os poetas, não porque os poetas são poetas, mas porque a poesia é uma força. Dirige a sua energia, constata-se, por linha diametralmente oposta, inclusive, à de Sócrates. Antecipando Bacon e o movimento moderno científico, em sua compreensão da importância do conhecimento ordenado ou sistematizado, dedicou-se à tarefa de reunir e formular o conhecimento, constituindo-se em pioneiro historiador da natureza. Empenhou-se no mister da comparação e da classificação. Platão havia dito: “Tomemos o governo da vida e remodelemo-lo”; seu grande discípulo e sóbrio sucessor restringiu tremendamente o sonho de Platão: “Conheçamos primeiramente um pouco mais da vida, e enquanto isso usemos e sirvamos o rei”. Em Aristóteles, a política tornou-se um objeto de estudo e observação, em parte, nota-se, diversamente de Platão, que efetivou teórica e factualmente experiências destinadas à transformação das instituições políticas. Em função disso, a ciência para Aristóteles de ser a ciência sobre a realidade, e de caracteres universais e não individuais. Nem por isso, todavia, a filosofia aristotélica aceita o transformismo universal, o qual situava, principalmente nos filósofos pré-socráticos, a contínua transformação do universo. De certa maneira, tal posição constitui-se em contrária ao evolucionismo, mostrando-se coerente com as noções das espécies fixas. Conseqüência disso é por exemplo a defesa da natureza. É necessário ainda, para melhor compreensão do pensamento aristotélico, observar o contexto de sua época. O que se via então era o desânimo, naqueles dias, dos homens de inteligência. Havia-se desvanecido a fé no poder dos homens de criar as próprias condições da vida. Já não havia utopias. A marcha dos acontecimentos era, manifestamente, demasiado poderosa para poder ombrear com ela o esforço organizado de homens de fina inteligência mas de poucos recursos. Era possível pensar na remodelação da sociedade humana quando esta era uma pequena cidade de alguns milhares de cidadãos, mas o que estava agora a acontecer era qualquer coisa como um cataclisma; era a remodelação política de todo o mundo conhecido, da vida política de uma humanidade que já somava então entre cinqüenta e cem milhões de seres. Era reconstrução em escala que nenhuma inteligência humana estava ainda em condições de aprender. E o pensamento, sob esse aspecto, sob esse peso, voltou-se para o vasto e implacável destino. Os homens passaram a olhar para tudo que parecesse estável e consolidador. A monarquia, por exemplo, apesar de todos os seus vícios manifestos, era um governo concebível para milhões; tinha, até certo ponto, “ funcionado”; impunha uma vontade dominante onde parecia ser impossível uma vontade coletiva. Essa atitude intelectual harmonizava-se com o respeito natural de Aristóteles pelo fato conhecido, estabelecido. Ora, verdade é que, não obstante as divergências entre discípulo e mestre, Platão parece já fazer parte do nosso mundo cotidiano, como se ele não pertencesse ao grande mundo dos pensadores. Afinal, qual de nós, particularmente os brasileiros, legisladores ou meros cidadãos que somos, ainda não sonhou com a implantação, do início até o fim, de uma “sociedade ideal”, livre de todas as desigualdades. Dadas as distâncias históricas e a enorme astúcia do escritor Platão, já decorridos vinte e quatro séculos, a familiaridade que parecemos ter com a obra do filósofo ateniense pode ser, porém, enganosa. Contudo, a julgar pelos pontos em comuns constatados nos contextos das duas eras, a de Platão e a contemporânea, mais fortalecida resta a convicção de que a concepção e o desenvolvimento do fenômeno estatal teve, paralelamente, inúmeras conseqüências na forma de condicionantes sociais, o que produz, até hoje, uma busca constante da identificação do Estado com o justo. E por isto, é de inegável importância o estudo de tal situação em relação ao Direito Natural, uma vez que este fornece, ao longo da história, à experiência jurídico-social, os princípios basilares de justiça. Justiça, aliás, enquadrada no âmbito das virtudes morais por Aristóteles, principalmente ao vincular estreitamente a justiça e a maldade, demonstrando efetivamente a posição do filósofo ensinando que o que é justo o é por natureza. Não é outra coisa o que se vê no livro V da Ética a Nicômano, onde há trechos que traduzem exemplos do sistema filosófico aristotélico sobre a justiça e a injustiça: “O homem sem lei é injusto e o respeitador da lei é justo; evidentemente todos os atos legítimos são, em certo sentido, atos justos; porque os atos prescritos pela arte do legislador são legítimos, e cada um deles, dizemos nós, é justo...Por essa mesma razão se diz que somente a justiça, entre todas as virtudes, é o bem de um outro, visto que se relaciona com nosso próximo”.
(Marcus Moreira Machado)

TERÇA-FEIRA, 22 DE SETEMBRO DE 2009:" BEM SUPREMO"

Platão, para figurar os problemas sociais da educação, utilizou uma seqüência de imagens, conhecida agora como “mito” da caverna, que na realidade não é um mito, vez que não possui qualquer acolhida religiosa coletiva. No “mito”, Sócrates conversa com Glauco, um dos irmãos mais moços de Platão. Confirma-se, pelo diálogo, a ligação da imagem das sombras na parede da caverna à questão entre o sensível e o inteligível, na sua estabelecida diferença. E aos prisioneiros dessa caverna somos nós todos comparados. Sobre a sua teoria política, voltada à felicidade coletiva, Platão a expressa através do estrangeiro, no diálogo “Político”: “Eis, pois, terminado em perfeito tecido o estofo que a ação política urdiu quando, tomando os caracteres humanos de energia e moderação, a arte real congrega e une suas vidas pela concórdia e amizade, realizando, assim, o mais magnífico e excelente de todos os tecidos. Abrange, em cada cidade, todo povo, escravos ou homens livres, estreita-se todos na sua trama e governa e dirige, assegurando à cidade, sem falta ou desfalecimento, toda a felicidade de que pode desfrutar”.Platão ensinou na Academia. Foi, na sua velhice, o mestre de um jovem de Stagira, na Macedônia, de nome Aristóteles, filho do médico do rei da Macedônia. A inteligência de Aristóteles era de feitio bem diferente da do grande ateniense. Aristóteles era naturalmente cético a respeito da vontade criadora e manifestava um grande respeito e enorme compreensão pelo fato estabelecido e provado. Porém, é inegável, a teoria das idéias de Platão influenciou basicamente o sistema filosófico do seu discípulo, Aristóteles. Para este, o fim último da sociedade é atingir a felicidade, que, consistindo na auto-realização do homem, utilizaria como meios o Estado e o Direito. Logo, o Estado é tão somente meio para alcançar o supremo bem: “eudaimonia”, a felicidade universal. Disto decorre que o direito não se forma calcado nas leis positivas, mais sim como fruto da natureza. Isto é essencialmente o Direito Natural.
(Marcus Moreira Machado)

SEGUNDA-FEIRA, 21 DE SETEMBRO DE 2009: "COMUNA NA COMUNIDADE"

O contexto cultural no qual desenvolveu-se a filosofia platônica demonstra a problemática política como precípua preocupação da sua Academia. Assistiu Platão em sua época a tirania dos trinta, a condenação e a morte de Sócrates, entre tantos outros fatos que evidenciaram ao filósofo a fragilidade da idéia de justiça nos governos helênicos. E na sua “República” Platão manifesta, pois, princípios básicos a propósito da justiça e do direito idealizando o Estado modelo. Idealista, buscou incessantemente a correlação entre as formas e a realidade, apresentando o homem e o Estado em paralelismo e “sendo o Estado um homem em ponto grande – o macroântropos – com características fundamentais idênticas às do homem ideal em ponto pequeno. Uma outra coisa, além dos conflitos do seu tempo, estimulou, talvez, o espírito de Platão nessa direção. Na época de Péricles, Atenas fundara muitas colônias além-mar, e a fundação dessas cidades familiarizara os homens com a idéia de que a comunidade não nasce e cresce apenas, mas pode ser feita. E nessa comunidade, entendida como o próprio Estado, existiram, segundo Platão, três classes: a dos sábios, a dos guerreiros e a dos comerciantes, operários e artesãos. A missão da primeira, cuja virtude é a sabedoria, reveste-se da execução do governo, sendo a da segunda, para qual a virtude é a coragem, a de defender o Estado, e a terceira, tendo por virtude a sobriedade, a de nutrir os defensores do organismo estatal. Depreende-se do entendimento de Platão para o Estado que o objetivo do organismo político é usufruir o indivíduo da felicidade coletiva, decorrente da realização individual através do trabalho, ou seja, fazendo parte da “polis” o indivíduo cumpria a sua função social, que consiste na razão de ser do homem. A divisão em classes não obedece outro critério senão o da repartição do trabalho, de maneira racional. Por isso, face aos fundamentos metafísicos presentes, o Direito Natural em Platão constitui-se na disciplina jurídica do Estado utópico. O Direito Natural informa a teoria política de Platão de forma substancial, sendo que o direito positivo ou convencional somente angariaria efetiva validade se ajustado à essência do Direito Natural, visto traduzir a própria idéia de justiça. Concepções como a de Platão, mesmo utópicas, requerem e produzem reformas sociais radicais.Platão defende a entrega do comando da administração estatal para os mais sábios porque, estando o intelecto associado com as necessidades de transformação e criação de um ente social, seriam estes os mais capazes para gerir o bem comum e a justiça, ao mesmo tempo em que fomentariam a imprescindível libertação de consciência. Por efeito, justificada resta a relevância do processo educativo dada por Platão, considerando que a educação comunitária é a responsável pela formação das classes, segundo cada função social das mesmas, de acordo com as virtudes específicas correspondentes a cada segmento. Por conseguinte, a formação do indivíduo é pertinente às atividades da classe a que ele pertence, mas nem por isso qualquer uma delas exercerá papel preponderante no ato de usufruir da felicidade coletiva. (Marcus Moreira Machado)

DOMINGO, 20 DE SETEMBRO DE 2009: "ESTADO CONCEITUAL"

Ainda que de maneira análoga, sem qualquer defesa a um conceito de história cíclica, fato é que também o filósofo Platão, tal como hoje, viveu em um tempo de dúvida, em que todas as relações humanas estavam sendo discutidas. A sugerida similaridade tem determinada explicação se bem compreendida a realidade de então. Ora, nos grandes dias de Péricles, antes de 450 a.C., parece ter existido em Atenas uma completa satisfação com as instituições políticas e sociais. Não havia, então, motivo para interrogações. Os homens sentiam-se livres; a comunidade prosperava; sofria-se, mas sobretudo, de inveja. A história de Heródoto não salienta nenhum descontentamento com as instituições políticas de Atenas. Mas Platão, que nascera pelo tempo da morte de Heródoto e que cresceu na atmosfera de uma guerra desastrosa e de grande sofrimento e confusão social, esteve, desde o princípio, face a face com a discórdia humana e inadaptação das instituições humanas. A esse desafio respondeu a sua inteligência. Tanto num dos seus primeiros trabalhos quanto no seu último livro, são penetrantes e diretas as discussões sobre o melhoramento possível das relações humanas. Sócrates lhe havia ensinado a nada ter como indiscutível, nem mesmo as relações de marido ou mulher ou de pai e filho. A sua “República” – o primeiro dos livros sobre Utopia - é o sonho de um jovem a respeito de uma cidade em que a vida humana se acha organizada de acordo com um plano novo e perfeito; o seu último e inacabado trabalho, as “Leis”, é um debate sobre uma outra utopia. Platão, definitivamente, é uma coisa nova no desenvolvimento da humanidade, o aparecimento da idéia na remodelação completa das condições humanas. Foi Platão, assim, o responsável pela mais antiga elaboração filosófica sobre o conceito de Estado, provavelmente. Porque com os filósofos vieram as palavras claramente dirigidas à nossa espécie, como se fosse algo inteiramente razoável e natural: “Governai as vossas vidas. A maior parte das coisas que vos perturbam, podeis evitá-las; a maior parte das coisas que vos dominam, podeis derrubá-las. Podeis fazer como quiserdes com elas”. Até então, o jusnaturalismo cosmológico dos pré-socráticos – identificando a ordem da natureza com a ordem social – não se preocupara com as sutilezas de uma conceituação de “polis”, que somente evidenciar-se-iam necessárias a partir da mudança no objeto das preocupações especulativas do “cosmos” para o homem, isto é, a partir do período denominado “antropológico”, tratado pela filosofia grega na definição da ordem humana com relativa independência da ordem cósmica. Platão é, por isto, o primeiro a elaborar uma filosofia do Estado. (Marcus Moreira Machado)

SÁBADO, 19 DE SETEMBRO DE 2009: "REALISMO SOCIAL"

Relevante é a crítica que se impõe ao poder, na dogmática jurídica. Exame esse que se propõe através do jusnaturalismo, em apreço do binômio “Estado e Direito Natural”, com o objetivo de proporcionar uma revisão das suas construções doutrinárias. E, neste âmbito, é patente o questionamento, sempre salutar, na medida em que a sociedade humana, culminando no advento do Estado, discerne em seus particulares limites um sistema jurídico para, em contrapartida, constituir, ao lado das proposições jurídicas, conceitos e regras dispositivas ao tratamento dessas mesmas propostas. As inquirições decorrentes, então, guardam pertinência à formação de abstrações, em um patamar onde será possível exigir a autonomia do conhecimento, imposta pelo moderno desenvolvimento da ciência, confirmando-se uma teoria do direito de maneira a distinguir-se ‘dogmática’ e ‘realismo social’. Nessa distinção, constata-se a limitação da primeira, incapaz de ir além da segurança individual pela aplicação do direito num Estado de Direito. Nem ambigüidade nem verdadeiro paradoxo, o que de fato se registra é a justiça assumindo, em todos os lugares, o seu inestimável valor, desejada por todos os que vivem o drama da história humana ante o vertiginoso avanço ao futuro, onde o passado recente, e não menos o presente, são marcados pela habitual beligerância a assolar a humanidade. Trata-se de indagar sobre a validade, ou, antes, a validez, de normas de Direito Positivo contextualizadas no cenário da veemente contradição entre o imediatismo, típico à auto-suficiência e espírito de grandiosidade atuais, e a subjugação do homem por si mesmo, já afastado da incumbência de promover a transformação do direito em concomitância com incisiva modificação da realidade em que deva ser inserida a justiça, restituindo-se-lhe o seu máximo valor. Pois, somente nessa valorização é que deverão estar referidos todos os progressos já alcançados ou por conquistar. No aprimoramento da relação entre direito e ideologia, vislumbramos uma mais precisa identificação do Estado com o 'justo', na premissa de que o Direito Natural é requisito essencial dessa nova dimensão, porque, já tendo fornecido, ao longo da história, os basilares princípios de justiça à experiência jurídico-social, informa também, contemporaneamente, o Estado de Direito, na consagração dos direitos individuais, inicialmente, e na conquista do reconhecimento de direitos inalienáveis e pertencentes a todos os homens, pela comunidade internacional, em seguida. (Marcus Moreira Machdo)

SEXTA-FEIRA, 18 DE SETEMBRO DE 2009: "IDÉIA DE ESTADO"

Faz-se indispensável sistematizar conceitos fundamentais das relações entre o Estado e o Direito Natural. Delimitada sob esse critério, impõe-se abordagem a enfatizar aspectos relevantes e contemporâneos do tema, pela demonstração de pressupostos da experiência jurídico-social que envolve o Estado. Com efeito, a dissertação crítica indica o vínculo entre as múltiplas ideologias e suas respectivas efetivações através desse Estado, em correspondente fenômeno jurídico; e busca, por conseguinte, comprovar a sua identificação com o justo, em defesa do ideal sempre presente na evolução do pensamento jusfilosófico. Berço do Direito Natural e estrutura da própria justiça, trata-se de doutrina que, arquétipica em suas origens informadoras, que merece resgate, a partir da máxima preocupação com o ‘homem’, com o fim de realizar os valores essenciais ao gênero humano. Afinal, num mundo como o de hoje, marcado pelos progressos da ciência e da técnica, à mercê do espírito de grandiosidade, auto-suficiência e imediatismo, impõe-se à história humana a premente necessidade de responder com sabedorias aos desafios do nosso tempo. E compreender a evolução da idéia de Estado será alcançar o que ao homem parece então faltar –a justiça em seu conteúdo no fenômeno jurídico, a possibilitar o conhecimento dos liames que a separam ou a integram ao cerne do direito. Assim, em última análise, é preciso demonstrar que a justiça deve ser realizada pelo direito, promovida no Estado, alcançada em sua concretude, sentida entre os homens, sem subtrair-se do fenômeno jurídico o que ele contém de respostas às exigências da real cidadania. Imprescindíveis, então, as contribuições à crítica para a recuperação da justiça enquanto prestigiada informadora do direito, a ele inerente, dele indissolúvel quando se quer a realização do justo, trazendo subsídios ao redirecionamento da coerção, reduzida, via de conseqüência, a representação da força concreta (física) do direito; e traduzindo a justiça, pois, na sua força interior, na sua tensão, na sua contextura racional interna. (Marcus Moreira Machado)