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sexta-feira, 13 de junho de 2008

TERÇA-FEIRA, 17 DE JUNHO DE 2008: "CONSERVAÇÃO".

A realidade da própria antecipação, visada pela imaginação utópica não delirante, é a única realidade plausível. Negá-la é negar a imaginação concreta -a trabalhar não só com dados reais, mas também com a vontade do homem. Recusá-la é antecipar a morte, ocultando-se na camuflagem de plural supressor de individualidades.
Na tendência do "coração" humano a se torturar ao extremo, essa imaginação utópica (anterior ao homem) não pode ser desprezada em prejuízo da vida. A previsibilidade de mundos rigorosamente ordenados garante com exclusividade o poder dos que se entendem iluminados na condução da humanidade. Diversamente, a imaginação do concretismo utópico é uma necessidade na sobreposição dos clamores falsamente civilizatórios e libertários.
Com possibilidade de aniquilamento total do indivíduo, a resignação há que ser alterada quando houver disposição para o reatamento dos vínculos com a essência natural, verificada no passado. Com efeito, hoje, como se a cibernética tivesse adotado novos critérios no sistema de controle do organismo humano, o homem perde seu maior direito -o de sonhar e poder transformar esse sonho em realidade concreta, com imediata proximidade.
Ao mesmo tempo em que perde a sua identidade, diluída na camuflagem do plural imperante, esse homem se refugia em instituições obsoletas, voltando-se, qual numa prece, com devoção, àquilo que precisa ser objeto de sua crença. E assim tem perdido, ainda, a capacidade de crer em si próprio, rendido à liderança, que outra coisa não faz senão de tal maneira limitá-lo a nutrir hostilidade contra os seus desejos mais íntimos e genuínos.
O homem tem se tornado um conservador, esteja essa 'conservação' presente num governante ou num governado. E desse conservadorismo advém a insânia, como decreto de seu "suicídio"; a negação da vida como natural aspiração. Como é contradição entre sua natureza real e o que se lhe projeta como ideal, ele sucumbe, não mais suportando sua permanência neste mundo.
Resgatar 'crenças' sinalizadoras de um lugar melhor, porém, neste mundo mesmo, será estar mais próximo da vida e da felicidade nela contida.(Marcus Moreira Machado)

SEGUNDA-FEIRA, 16 DE JUNHO DE 2008: "TERROR".

A multidão circula pelas ruas, disputando espaço com automóveis, ônibus e ciclistas. Multidão e veículos não são apenas um grotesco movimento; fazem parte de uma cena 'impressionista', a ocultar verdadeiras formas, encerrando conteúdo não revelado. Não há transparência; nesse 'instantâneo', todos só fazem terminar mais um dia, adiar a paz, na mais exata tradução de vida circular e confinada. E com grande expectativa, é o quê também esperam do futuro.
Como em Edgar Allan Pöe, há segredos que não se deixam revelar. Homem e chusma se confundem em surpreendente movimento, no medo exacerbado do 'estar só'. É como se o amanhã não devesse existir. Então, o alarido, o som das buzinas, as luzes de neon, placas, cartazes. O mundo em liquidação. Tudo como se fosse possível afugentar o martírio do 'presente', ou um 'futuro' imediato. Por isso, o homem é bicho enjaulado em tudo o que ficou como pretérito. Qual um condenado, ele só se permite reviver fatos e sentimentos -um inútil resgate de si próprio. Porque o passado é ameaça para quem quer escapar da vida; ele invade a alma e deixa a sensação de que a vida 'não é', 'não foi' e jamais 'será'. E tudo é feito no mesmo momento em que ela "é ânsia por si mesma".
Sem a esperança daquilo que 'não é', 'não existe', porém, que pode 'vir a ser', perde-se a força do sonho transformador. Em seu lugar, o realismo "responsável" que nada constrói; antes, é a inegável estagnação, reacionarismo demagógico. Destituída de fatores objetivos, a sociedade, assim organizada, evita buscar elementos mediadores assecuratórios de futura existência, hoje ainda impossível, pois não pretendida nem planejada. Então, teme-se a morte. Contudo, não é outra coisa o que se pratica. Não se admitindo na experiência da plenitude, o homem civilizado prefere a morte adiada, cultuando-a como a um deus que aplacará o fantástico e absurdo da imensurável existênca humana; confessa o seu medo, por desconhecida a morte. Todavia, parceiro dela, não admite o seu terror à vida, face à fragilidade que lhe é inerente. Porque, enfim, a morte é vigorosa, iminente e fatal; a vida, uma formidável promessa, nunca cumprida, sempre esquecida.(Marcus Moreira Machado)

quinta-feira, 12 de junho de 2008

DOMINGO, 15 DE JUNHO DE 2008: "VENDA A VAREJO".

Eu sou um vendido. Por 30 moedas me vendi. Logicamente, cuidei de considerar o câmbio oficial e o paralelo, cotando o meu preço no maior valor do euro. Mais eu confesso: antes, me dolarizei. É imoral -dizem- alguém se vender. É ilegal -afirmam- pactuar em moeda estrangeira. Pois bem, dos males o menor: a moeda do Tio Sam serviu apenas de referencial, desagravando o meu delito-pecado. Nem bem atulhei os meus bolsos e já procurei uma empresa de "turismo" (dinheiro viaja também!), para nacionalizar (em reais) a minha economia, é claro, e não porque pensava em comprar passagens aéreas para algum paraíso no Caribe. Pois, nós sabemos, empresas desse naipe apenas promovem o inédito turismo pela ciranda financeira tupiniquim. Mas isso não interessa, eu nada tenho a ver com a vida alheia. Não que eu costume ficar "em cima do muro" ou coisa do gênero; muito pelo contrário, eu quero mais é derrubar todo e qualquer muro, para que não mais exista o tamanho pequeno de um 'lado direito' e um 'lado esquerdo'. E como eu professo por desprezível ideologia de qualquer matiz (por entender que é nela que se abriga o fascista (de 'direita' e de 'esquerda'), nada me resta senão confessar aos patrulheiros da ordem universal que transgredi. E devo por isso, eu sei, aceitar o meu expurgo do reino dos bem-aventurados políticos desta terra que vive ao deus dará. Já não me interesso por nenhuma versão moderna de um incerto Cavaleiro da Esperança. E chega de rememorar colunas, prestes! Hoje, mais que nunca, quem realmente faz coluna, neste país gigante desgovernado por repugnantes anões, é qualquer um que escreva a 'Social' de qualquer tablóide.
Dorothy Parker... Blasfemava Dorothy, será, ao afirmar: "o dinheiro não pode comprar a saúde, mas eu me contentaria com uma cadeira de rodas cravejada de diamantes" !? Hein?! Diga lá você que está protegido em seu esconderijo de livre nomeação! Você mesmo, que tanto apregoa combater as oligarquias... Você já parou e refletiu na possibilidade oligárquica do seu governo de poucos contemplados e idéia alguma?!!
Pois eu me vendi, confesso. Houve quem quisesse me comprar pelo preço que eu pedi, muito mais, aliás, que o reivindicado nos estéreis discursos febris dos superados fabris comitês da "mais- valia". Não socializarei a incompetência de quem, eternamente "vítima", não se dispõe a trabalhar. O que faço é elaborar 'teoria' para a 'práxis' do meu "cliente" -mais ou menos como se faz em propaganda e marketing. Não sou megalomaníaco nem prepotente; muito pelo contrário, eu sempre me desfaço dessa onipotência tão comum nos indolentes, o que, certamente, me assegura o direito de permanecer acima da arrogância dos vulgares.
No varejo, eu me venderei tantas vezes quantas puderem me pagar, sem deixar de observar, habitualmente, que 'contradição' é 'máxima' na criatividade.
Da mesma maneira, no entanto, continuarei a confessar e confessar. Tantas confissões quantas vezes puderem pagar o meu preço.(Marcus Moreira Machado)

segunda-feira, 9 de junho de 2008

SÁBADO, 14 DE JUNHO DE 2008: "ATLÉTICOS".

Nada de novo acontece. Está tudo fora do lugar, como sempre esteve. Todos prometendo e ninguém cumprindo. O futuro chegou faz tempo, ele já não causa espécie. No Brasil, estamos de volta ao passado. Em breve instante, tudo já aconteceu: a Independênca e a República (a "Velha", duas vezes a "Nova"); Getúlio, os militares depois, os civis agora como outrora. Salvador, Rio de Janeiro, Brasília, cana-de-açúcar, café e cimento.
Calendário, agendas permanentes serão um bom presente? Será bom, compromisso marcado em país tão incerto?
Cá, o tempo varia. E tanto, que ampulheta nunca seria de exato formato, entre nós; provavelmente, ela teria alterada uma de suas bocas, comportando muito mais areia na parte de cima, estrangulando o tempo, impedindo-o de se deslocar à parte de baixo. Aqui, a pontualidade inglesa só existe na saída, nunca no horário de chegada. E isso, até porque nós, o brasileiros, somos todos atletas, ainda que não atléticos, todos correndo contra o tempo, batendo, superando recordes, num surpreendente despreparo físico na maratona contra a penúria.
Verdade, São Gregório não conhecia o Brasil. Por isso, em se tratando de datas, para nós o que de fato sobrevive são as calendas gregas, ou, o "Dia de São Nunca".
Nada mais condizente num país onde parece que estão a falar grego, onde os presentes são de grego, onde olímpicos nativos erguem a tocha para "alumiar" os dias 'noturnos' da eterna noite.(Marcus Moreira Machado)

SEXTA-FEIRA, 13 DE JUNHO DE 2008: "LEGUMINOSAS".

Hoje, eu acordei com vontade de só falar abobrinhas. Eu sei que o seu ouvido não é penico, mas, desde que -paixão nacional!- a corrupção foi adotada como modalidade esportiva preferida de brasileiros, desligar o ventilador não é hábito frequente. E como aqui tudo é efemérides, nada mais proveitoso que tentar identificar as cores pátrias no genuíno mimetismo da preservação da espécie nativa; quer dizer, disso que inadvertidamente entendemos por 'povo'.
Veja só se não tenho razão. Nos bares e nas padarias, em praças e em clubes, sempre onde haja, enfim, mais de uma pessoa, o assunto é sempre o mesmo, a mania não muda. É quase um cacoete (ou, será, uma catarse coletiva!?): falar, achar isso e aquilo, bradar, protestar, admitir, negar, palpitar, sugerir sobre tudo o quanto não foi, quanto não é, ou quanto ainda será um grande, um inédito e pomposo escândalo -no Planalto, na planície, no Palácio... E tome CPI! Aliás, CPI já virou logomarca, rótulo; não é mais que mera sigla.Você já percebeu como a moda de todas as estações é denunciar? Denunciar o presidente, o governador, o deputado, o vereador, o procurador; denunciar o irmão, o pai, a mãe... e o vizinho mais próximo, quando não se tem mais a quem denunciar. Comentar, fingindo inocência, que o fulano não trabalha, que ele vive de muamba que traz do Paraguai (e você compra), é agora exercício de cidadania, tanto quanto a polícia federal monta operações james bond a fim de apanhar quem apanhou a grana do INSS, ou quem comeu criancinhas, além dos comunistas já hoje saciados.
Nós nos tornamos um bando de fofoqueiros, experts em leguminosas, uma xepa de abobrinhas. Mas... tudo em nome de uma outra tonalidade de verde: a da democracia nacional!(Marcus Moreira Machado)

QUINTA-FEIRA, 12 DE JUNHO DE 2008: "ACREDITAR NO QUE PUDER".

Agora, falando sério, eu queria não falar; eu queria nem sequer precisar falar. Ficar quietinho em minha caverna, tendo mil idéias e não colocando nenhuma em prática, assim, num mundo meio altista, particularíssimo e indevassável. Já dei de mim o quê eu nem sabia que tinha. Quis dividir sonhos com quem não admitia sonhar; construí moinhos de vento para quixote nenhum botar defeito. Mas, agora, fantasias, só as com muito brilho e purpurina, no carnaval.
Se ainda abro minha boca ('fecha-te, Sésamo!'), é só bocejo de muita preguiça.
Agora, seriamente falando, eu quero acreditar só no que é verdadeiramente possível, e mesmo assim, possível a curto prazo, curtíssimo prazo. Não se trata de desencanto, mágoa ou qualquer coisa parecida. Alguns momentos de felicidad são o suficiente. Suficiente para mim, é natural. Não cresci nem diminuí. Talvez eu esteja encontrando o meu real "tamanho", ou, quem sabe, o 'tamanho' do meu mundo.(Marcus Moreira Machado)

QUARTA-FEIRA, 11 DE JUNHO DE 2008: "CAMALEÔNICA".

Nem tudo é Sodoma e Gomorra, Deus, certamente, não ungiu alguns poucos prosélitos de apocalíptica doutrina em missão redentorista dos brasileiros (mesmo sendo Deus brasileiro!). Porém, nas pegadas do "Rei- Sol", insistentes na repetição da máxima de Luis XIV -"L' état c'est moi"-, os "erquerdistas" daqui se consideram predestinados, por revelação divina, ao extermínio da conspurcação política nacional. Eles ainda não cicatrizaram as chagas de Ibiúna e, quiçá, até sonham com um novo Crusp, em acalentada quimera de fazer renascer "células" do Partidão entre estudantes e operários. É difícil a escolha: o descalabro da corrupção ou quem dela se serve buscando alimento na devassidão. Pois, esses abutres, hienas políticas militantes de incipiente "esquerda", encontram na podridão a fonte única dos seus monólogos políticos. E em tudo fazem lembrar o orgulhoso casal, pai e mãe, que assistia à parada militar: enquanto o pelotão inteiro marchava garbosamente, seu filho era o único soldado a trocar passos; mas seus pais, indiferentes, exclamavam -"que lindo exemplo, só o nosso filho marcha certo!". Também é assim com esses "esquerdistas": acreditam que somente eles marcham corretamente, os demais, tropeçam. No entanto, o que mais se vê nessa camarilha embrionária são os zezinhos e toninhos 'faz-de-conta'; todos fazendo de conta que trabalham. Tarefeiros, confundim pasquins com imprensa, entoando formidáveis panegíricos ao 'deus socialismo'. Nem o esquecido Reverendo Moon viu algo igual. Até Stanley Kubrick desconhecia as maiores possibilidades de lavagem cerebral em seu "Laranja Mecânica". Os "esquerdistas" desta república que ignora pacto federativo porque só conhece de 'república' a casa onde moram vários estudantes; esses esquerdistas conseguiram a proeza da própria superação, através de manuais de auto-doutrinação cheirando a naftalina de esoterismo barato. Por exemplo, mesmo sendo contra eleições -pois as consideram por demais burguesas-, disputam-nas nos sindicatos, nas associações de bairro, em grêmios estudantis, na Cipa e, se possível, até nas creches e jardins da infância. Afinal, "esquerda" camaleônica, seus militantes possuem o que é da natureza do poder: o mimetismo!(Marcus Moreira Machado)